Para assinalar os 10
anos do CAIS DO OLHAR, os fins-de-semana
estão guardados para lembrar alguns textos que por aqui foram sendo publicados.
A
BOLA
Em 29 de Janeiro de 1945, Cândido de
Oliveira fundou o jornal A Bola.
Já lhe chamaram, Bíblia, também
o Avante da Travessa da
Queimada.
O jornalismo de sarjeta que por aí se
faz, também atacou o jornal.
Desaparecidos os jornalistas, notáveis cronistas, diga-se, que lhe deram glamour, hoje
não passa de um produto amorfo, sem qualquer ponta de brilho, que aposta no
sensacionalismo para vender papel.
A
Bola tem a minha idade e poderei dizer
que foi no jornal do Cândido, como o meu avô lhe chamava, que soletrei as
primeiras letras e, sem exagero, gosto de dizer que aprendi a ler com A
Bola.
Quando o jornal fez 43 anos,
convidou algumas personalidades para se pronunciarem sobre a efeméride. O
cineasta João César Monteiro foi uma dessas personalidades:
«Se não estou em erro, sou ledor
de “A Bola” há mais de trinta anos. Do tempo em que era quase afrontoso ser
visto com “ela” debaixo do braço e nem sempre se ousava confessar o pecadilho
que era gostar de a ler. Para restituir a boa consciência a esse perverso
apetite, criou-se um álibi curioso. “A Bola” passou a ser, antes do mais, um
modelo de virtudes prosódicas, uma escola de bem escrever jornalístico. Com
alguma razão, diga-se, se fecharmos piedosamente os olhos a certas piroseiras
metafóricas que, de onde em onde, ensombram com a má literatura o bom
jornalismo.
Para ser franco e sem cair no pretensiosismo de ter mais em que pensar, nunca
pensei muito n’”A Bola”. Passo os olhos por ela, deixo-a deliberadamente na
mesa do café, encontro-lhe utilidades culinárias para embrulhar tachos com
arroz ou para absorver o óleo dos carapaus fritos. Numa ou noutra aflição, já
me tem valido, com todos os inconvenientes de estampagem de aí decorrente. Nada
de grave: conheço letrados bem piores.»
A Bola que hoje corre
por aí, com o mesmo nome, não tem nada a ver com o jornal do Cândido.
Foi, até certa altura, um jornal bem feito, interessante mas não ao ponto de,
com uma grande dose de exagero e injustiça, Carlos Pinhão ter afirmado, em
pleno salazarismo/marcelismo, que «o jornalismo desportivo era o melhor
jornalismo português». Carlos Pinhão esquecia-se (?) que A Bola não
ia à Comissão de Censura. Os outros, seus camaradas de profissão tinham de
escrever nas entrelinhas para tentarem fazer um jornalismo minimamente honesto.
À velha A Bola devo o
facto de Ruy Belo ser um poeta do meu panteão.
O meu conhecimento com Ruy Belo não
começou nem pelos livros, nem pelos poemas, mas por uns artigos sobre futebol
que, nos idos de 1972, publicou em A Bola.
Gostei tanto desses artigos que me interessei logo na procura de coisas acerca
de Ruy Belo.
Acabei a comprar-lhe os livros. O primeiro foi Homem de Palavra(s), uma
capa azul, um belo livro.
Lembrar Herberto Helder: «mais do que dizer que gostei dos livros de Ruy
Belo, gostaria de escrever que os acho fundamentais».
Texto publicado em 29 de Outubro de 2011
2 comentários:
Sem dúvida que a bola foi até, em determinada altura, o melhor jornal português (grandes jornalistas como Victor Santos, Carlos Miranda, Carlos Pinhão e muitos mais) nomeadamente quando era "lençol" e trissemanário -grande jornal, em tudo-.
Actualmente é uma tristeza, nem merece o nome de jornal; aqui há uns meses enviei um mail ao sub-director, um tal Delgado, e outro ao director, creio que um tal Serpa, e nem uma palavra como resposta.
Que falta de categoria, que falta de profissionalismo e são estes indivíduos que puseram o jornal na fossa e o hão-de afogar no lodo, sem salvação.
Aquela rapaziada tem mais que fazer do que ligar aos leitores.
O futebol, hoje, é uma trafulhice pegada.
Três jornais desportivos diários, eles têm que «inventar» factos e notícias, quanto a ideias, zero!
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