domingo, 29 de setembro de 2024

DISTO, DAQUILO E DAQUELOUTRO

Em Junho, Mia Couto venceu o Grande Prémio de Conto Branquinho da Fonseca da Associação Portuguesa de Escritores pelo livro «Compêndio para Desenterrar Nuvens.»

António Rodrigues, a propósito deste novo prémio de Mia Couto, para o Público de 30 de Agosto, suplemento Ipsilon, realizou uma excelente entrevista com o escritor moçambicano.

«Fico sempre surpreendido quando ganho um prémio. Não é coisa de falsa modéstia, mas sinto-me bem não tendo essa expectativa de poder ganhar, senão o prazer de fazer o livros e de escrever.»

António Rodrigues pergunta a Mia Couto:

Já sabe como vai gastar o dinheiro do prémio? Tem algumas dívidas para pagar?

«Quando se trata de dinheiro, sou péssimo. E sou péssimo, porque, felizmente, tenho algum privilégio, olhando para o mundo e para a maior parte das pessoas, para quem o dinheiro é uma preocupação do quotidiano. Não sendo rico, não tenho, nunca tive essa preocupação. Acho que se fosse mais pobre também não teria, porque eu via pelos meus pais, que não era gente que vivia de maneira folgada, antes pelo contrário, que ali faziam-se contas, mas o meu pai, que era poeta, nunca as fez. Era a minha mãe que controlava esse lado da vida. Eu herdei um pouco do meu pai esta coisa de estar desamarrado, e é um grande privilégio.»

Como já disse: uma excelente entrevista e um tempinho ainda para o seu final:

«Para terminarmos, e como diz que a sua linguagem é a linguagem da poesia, gostava de lhe perguntar: qual foi o seu verso mais conseguido?
Não lhe sei responder, mas o primeiro poema que fiz foi ao meu pai e, mais tarde, quando o meu pai morreu, despedi-me dele por via da poesia e percebi que tinha voltado a um verso feito 40 anos antes e que falava dessa criatura que vivia numa varanda como se vivesse num palácio. Como não sabia o que fazer com ele próprio, ficava ali com as mãos estendidas como se recolhesse esse orvalho que imaginava estar a tombar do céu. O verso não é exactamente esse, mas isso perseguiu-me como a grande lição do meu pai: dar importância àquilo a que ninguém ligava. O meu pai, no meio da guerra colonial, andava à procura de pedrinhas e sementes e olhava os pelicanos que passavam. Ensinou-nos a ver o que não tinha importância para os outros».

1.

Em apenas três dias, 2024 tornou-se o quarto pior ano da década em área ardida.

Do Público de 18 de Setembro

2.

No seu programa da SIC intitulado Conversas Secretas, o escritor Baptista-Bastos popularizou a pergunta «onde é que você estava no 25 de Abril?». Esta pergunta foi o ponto de partida para a Fundação José Saramago que, no quadro das comemorações dos 50 anos da Revolução de Abril, inverteu a questão e lançou um ciclo de conversas com o mote «Onde estarias se não fosse o 25 de Abril?».

1 comentário:

Seve disse...

MIA COUTO-gosto dele como pessoa e como escritor, grande escritor -um mago das palavras-!
Tive oportunidade de falar com ele numa Feira do Livro e senti que estava perante uma grande pessoa.
Como escritor é fantástico, vale a pena ler (já devo ter lido 50% dos seus livros publicados.)