«Uma autopromoção de um programa da rádio Observador na sexta-feira perguntava: "Como vamos viver sem a Rainha Isabel II?". Depois deixava um número de telefone a convidar os ouvintes a discutir tal putativa orfandade com os jornalistas José Manuel Fernandes e Helena Matos. Esta pequena vaga do maremoto mediático que se seguiu ao falecimento, na véspera, da monarca britânica, com uma torrente de jornalistas, comentadores, historiadores e diplomatas portugueses a lançar ondas e ondas de relatos, comentários e textos sobre o tema, numa inundação asfixiante que se vai prolongar, pelo menos, até ao dia do funeral da monarca britânica (e para o qual, de resto, também contribuo), deixou-me perplexo.
A pergunta colocada pelo Observador pressupõe que eu, cidadão
português, não-britânico, eleitor de uma República que gritou na versão
original do seu hino "contra os
bretões, marchar!, marchar!", devo sentir a falta da rainha Isabel
II?
Que mecanismos criam esta expectativa de simpatia lusitana para com a
mãe do agora Carlos III?
(…)
Esta atração de tantos jornalistas portugueses pela monarquia inglesa,
este encanto pela "ideia agradável" de ver uma família no trono, este
sentimento de perda de uma "mãe da nação" (que não é da nossa nação)
pressupõe uma disposição para a aceitação de um domínio aristocrático desse
tipo para Portugal, de vontade de adoção de um sistema com "partes
dignas" que sirva de "disfarce" para a impopularidade das
"partes eficientes" da governação, de redução do poder popular (e
mesmo da classe média) nas instituições da nossa democracia.
Esta cumplicidade com a monarquia britânica que tantos jornalistas
portugueses proclamam, mesmo inconscientemente, é conivente com a ideia de
retirar poder aos mais fracos para fortalecer o poder dos mais fortes.
Por mim vivo bem sem a rainha Isabel II, uma pessoa respeitável e com
evidentes méritos, mas que foi peça de um mecanismo de perpetuação de
privilégio da classe aristocrática o que, para mim, é inaceitável por ser a
eternização de um sistema onde uma parte da humanidade, por direito de
linhagem, explora outra parte da humanidade. Isso chama-se injustiça.»
Pedro Tadeu no Diário de Notícias
1 comentário:
Gente que até a sanita leva para onde quer que se desloque ... (tudo à conta do orçamento claro-mas parece até que, segundo dizem- os seus imensos subditos gostam-)...
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