Naquele tempo, o botas decretou que beber vinho era dar de comer a um milhão de portugueses.
O vinho bebia-se, comprava-se em tabernas, pipos ao alto, vindos directamente do lavrador ramo de louro à porta – abriu o vinho novo.
Já mais crescidote, quando o rei fazia anos, bebia, Aliança, Periquita, Evel.
Não havia supermercados, grandes superfícies, lojas de vinhos.
Depois, segundo declararam além-fronteiras, passámos a viver acima da nossas possibilidades e beber vinho torou-se moda fina-saloia, quanto mais caro melhor e o negócio generalizou-se ao ponto de não se saber se algumas casas, alguns restaurantes tinham vinho ou ouro dentro das garrafas tal os preço a que chegaram.
Dentro da moda criou-se uma linguagem própria para otários, histórias feitas para serem contadas a camelos.
Limitado que sou, não tendo o Aliança, o Periquita, o Evel continuado a ser vimnhos honestos, passei-me para as colheitas do ano e, amargamente, a lamentar que já não haja tascas a vender vinho, o tal que vinha directamente do lavrador.
Agora, o vinho chega em contentores-pack de 3, 5, 15 litros, acabando por se envolver num espartilho de palavreado debitado porcríticos publicitários, intitulam-se experts, saem-se com um linguajar inventado, ou até então desconhecido, para um país apenas conhecedor de meios copos, copos de três, ou penaltis.
Alfredo Saramago, algures, escreveu:
Existe um discurso demasiado sério sobre o vinho, é preciso que se restitua a liberdade a cada apreciador para poder julgar o vinho que bebe sem a espada de Dâmocles por cima da cabeça à espera de justiçá-lo se um aroma ou outro escapar ao paladar do desgraçado bebedor!
Cada vez que há feiras de vinhos em supers e grandes superfícies, não compro os vinhos, mas saco os catálogos e delicio-me com esse palavreado destinado a gente fina que, com o olho brilhante, delira com tudo aquilo, bebem as palavras com gosto, possivelmente com mais gosto do que que com o próprio vinho que, normalmente, não justificam tanto ruído.
Chamam-lhe notas de prova mas há quem vá mais longe, e os considere poemas vinícolas.
Que sejam:
Os aromas de barrica lideram o conjunto com as notas especiadas e balsâmicas mas o fruto vibrante não se apaga neste conjunto muito voluntarioso. Tudo no sítio, corpo estrutura, tanino, boa frescura e termina num longo pós boca.
Um estilo muito diferente, centrado nas notas frescas de ervas aromáticas e violetas com fruto intenso e muito elegante do tipo cassis. Muito «design» na boca, rendilhado, sem ser vigoroso, elegante e com boa sofisticação.
Aroma do tipo telúrico com notas de couro, frutos silvestres, muito mineral e ervas mediterrânicas, poderoso e frontal na aproximação. Um peso pesado na boca, muito tanino numa sólida estrutura, algum couro, fruto e força num estilo personalizado e de primeira linha.
Boca com garra e taninos firmes, muito boa estrutura, corpo e fruto sóbrio que termina num final ainda com alguma aspereza e muita especiaria. Um vinho de guarda
Um aroma muito doce com o fruto preto maduro em geleia e compotas, barrica bem casada. Na boca tem excelente volume, macio e gordo, conservando frescura, taninos sólidos. Termina muito longo ao fruto e tosta e cheio de elegância.
Estilo moderno e elegante com fruto preto, baunilha, tosta e café muito bem casados.
Notas apimentadas e frescas, fruto elegante de cereja num conjunto com alguma sofisticação. Firme e seco na boca, austero e cheio de força, taninos sólidos e um final longo bem condimentado.
Estilo quente e madurão, fruto de ameixa em passa, chocolate.
Notas fumadas e de alcatrão, fruto de amoras pretas muito maduras. Bem na boca, estruturado e concentrado no fruto e chocolate preto, pimentas muito firmes num conjunto com um longo pós-boca.
Legenda: não foi possível identificar o autor/origem da fotografia.
1 comentário:
Normalmente quem não tem nada de importante para dizer, diz coisas sem importância nenhuma, mas de forma embelezada por termos inócuos. Chamam-lhe Jargão e serve para os tolos se satisfazerem a si próprios.
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