domingo, 7 de setembro de 2014

NESSA PROCURA CONSTANTE DE MÚSICA


Ouvíamos sobretudo rádio; durante muito tempo, não tivemos gira-discos. Muita BBC. A minha mãe era uma sintonizadora, de dedos irrequietos. Óptimos músicos britânicos, orquestras de dança do Norte, os habituais nomes dos espectáculos de variedades. Belíssimos músicos. Só material de primeira. Se a música era boa, a Doris dava com ela, e eu cresci nessa procura constante de música. Ela dizia-te de chofre se um músico era bom ou não. Que musicalidade a dela, Ouvíamos uma voz, toda a gente a pensar que seria um grande soprano, e ela: «Só guinchos.» Isto antes da televisão, Cresci a ouvir música maravilhosa, incluindo algum Mozart e Bach lá ao fundo; na altura, custavam-me a engolir, mas mesmo assim absorvia-os, Basicamente, era uma esponja musical. E ficava fascinado quando via alguém tocar. Músicos de rua, um pianista num pub – atraíam-me como o mel a uma mosca. Os meus ouvidos bebiam nota após nota. Pouco importava se desafinassem: eram notas no ar, ritmos, harmonias que bailavam nos meus ouvidos. Como uma droga. Uma droga muito mais forte do que o cavalo, para dizer a verdade. Fui capaz de largar o cavalo; nunca seria capaz de largar a música. Uma nota leva a outra, nunca sabes bem o que virá a seguir, nem queres saber. É como seguir em frente numa maravilhosa corda bamba.
Se não me engano, o primeiro disco que comprei foi Long Tall Sally, do Little Richard. Fantástico ainda hoje. Um bom disco só melhora com a idade. Mas o que me deu mesmo a volta à cabeça, numa noite em que sintonizei a Rádio Luxemburgo, quando já há muito devia era estar deitado e a dormir, foi Heartbreak Hotel. Uma verdadeira explosão. Era a primeira vez que ouvis a canção. Nunca tinha ouvido nada assim. Nem sabia quem era o Elvis, mas foi como se estivesse à espera daquele momento. Quando acordei, no dia seguinte, não era a mesma pessoa.

Keith Richards em Life


Sem comentários: