segunda-feira, 27 de abril de 2015

OS IDOS DE ABRIL DE 1975


27 de Abril de 1975

OS JORNAIS continuam a dar relevo aos resultados das eleições para a Assembleia Constituinte.
Hoje, sabe-se que não mais voltou a existir um grupo de deputados, de todos os partidos, como aquele que foi eleito.
Quer política quer culturalmente.
Nas páginas de cobertura do acto eleitoral o Popular conta a história de uma senhora de 78 anos, que se apresentou no local da votação «a tremer e as lágrimas a rebentarem nos olhos, implorando que a ajudassem.» Obtida a concordância dos seus colegas, o presidente da mesa aproximou-se dela e ajudou-a a fazer um risco no voto («estava provado à evidência, que aquele não seria um acto político consciente», daí a opção pelo voto nulo).
À saída, o repórter fala com a cidadã. Fica a saber que é moradora na Rua do Arco Carvalhão, «onde proliferam barracas». E que vive «de uma esmola da Misericórdia».
- Veio votar porquê?, pergunta o jornalista.
-Porque tinha medo que me retirassem a esmola.
O repórter vê, no episódio, «uma marca indelével do fascismo». E também o «preço de uma aprendizagem política» a haver.

NATÁLIA CORREIA, no seu livro Não Percas a Rosa:
À medida que a televisão transmitia imagens do cerco repugnante dos repórteres aos eleitores rústicos que se avizinhavam das assembleias de voto, a certo regista:
Interpelando uma idosa mulher do campo, um dos garanhões da reportagem destinada a vexar a consciência cívica das populações rurais, lançou-lhe este desafio:
- A senhora sabe o que é uma Assembleia Constituinte?
A velha estacou para o medir com um olhar desprezível e ripostou-lhe numa ironia embaraçante:
- E vossemecê sabe o que é um almude?

DOMINIQUE POUCHIN à conversa com Mário Soares:
Um ano. Dia após dia, a seguir à sublevação libertadora dos capitães, Portugal elegeu os deputados à Assembleia Constituinte: eis chegada a hora que Você tanto esperava, certo de que seria a desforra. À noite, nos salões da Fundação Gulbenkian – onde mil jornalistas de toda a parte do mundo ouviam os resultados sem surpresa -, saboreava a sua vitória e o fracasso dos comunistas. Em privado, Você não deixaria de notar que este segundo 25 de Abril seria um duro golpe para aqueles que fizeram o primeiro.

Fontes:
- Acervo pessoal;
Os Dias Loucos do PREC de Adelino Gomes e José Pedro Castanheira.
- Não Percas a Rosa de Natália Correia
- Portugal: Que Revolução? de Mário Soares e Dominique Pouchin, Perspectivas & Realidades Editores, Abril de 1976.

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