M Train
Patti Smith
Capa: Rui
Rodrigues
Tradução
Helder Moura Pereira
Quetzal
Editores, Lisboa, Maio de 2016
Não é assim tão fácil escrever sobre coisa
nenhuma.
Isto era o que um cowboy estava a dizer
quando eu ia mesmo quase a entrar num sonho. Vagamente bonito, intensamente lacónico,
ele balançava-se numa cadeira desdobrável, reclinado para trás, com o seu
Stetson a roçar a parede exterior de um café isolado de cor parda. Digo isolado
porque parecia não haver mais nada ali por perto, exceto uma bomba de gasolina
fora de uso e um bebedouro enferrujado, enfeitado com um colar de moscas
pousadas sobre os últimos resíduos da sua água estagnada. Também não havia
ninguém por ali, mas isso não era coisa que o importunasse; limitou-se a puxar
a aba do chapéu para cima dos olhos e continuou a falar. Era o mesmo modelo
Silverbelly Open Road que Lyndon Johnson costumava usar.
- Mas nós continuamos o nosso caminho –
prosseguiu ele, alimentando todo o tipo de esperanças loucas – Para redimir a
perda, um pequeno momento de revelação pessoal. É um vício, como jogar nas
máquinas ou uma partida de golfe.
- É muito mais fácil falar sobre coisa
nenhuma – disse eu.
Ele não ignorou a minha presença completamente,
mas foi incapaz de contestar.
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