Discurso Sobre a Cidade
Daniel Filipe
Sagitário, Porto
1957
São múltiplas as faces da cidade. Matinal ou nocturna,
para a conhecer é indispensável descobrir todos os seus disfarces. Quem dela se
abeira em busca do rosto único e imutável, busca a simplicidade, que é engano,
a evidência no que é íntimo, misterioso, oculto. Diversa e contraditória aos
olhos que a percorram com amor, nisso reside a sua maior grandeza e sua força.
Exterior à cidade, não a possuirás nunca. É preciso
esquecer, é preciso aceitá-la, como um menino aceita o seio de sua mãe. É
preciso que lhes dês um amor novo — um amor feito de conhecimento e de dádiva. É
preciso que as tuas veias sejam as veias da cidade — e o sangue rubro, vivo,
corra cantando nos teus músculos mortais e aflore de sonho as pedras da cidade.
É preciso, afinal, que faças parte da cidade.
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