quinta-feira, 9 de abril de 2015

OS IDOS DE ABRIL DE 1975


9 de Abril de 1975

Miguel Torga continua inconsolável com a Pátria.

As páginas do seu Diário dão conta desse estado de alma.

Hoje, escreve:

Cansado. Não de lutar, mas de lutar contra fantasmas. Cada português é um espantalho vestido de gente. Se uma pessoa lhe dá um tiro, fura uma ficção.

Já anteontem, escrevera:

Os estrebuchões que a pátria dá no hospital revolucionário a que a reduziram! Necessitada de uma clarividente terapêutica revitalizadora, ninguém esperava vê-la do pé para a mão transformada de norte a sul num desesperado corpo convulsivo. Mas somos assim: ou tudo, ou nada. Ou amodorrados numa sonolência de morte, ou possuídos de uma agitação frenética. Os catalépticos, ou atacados da doença de S. Vito. O espectáculo que damos neste momento ao mundo não é o de um povo que se esforça por actualizar ousada e sensatamente a sua vida retrógada. É o de um manicómio territorial onde enfermeiros improvisados e atrevidos submetem nove milhões de concidadãos a um electrochoque aberrante e desumano.

Fonte:

Diário, Miguel Torga, Volume XII, Publicações Dom Quixote, Lisboa, Novembro de 1999.

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