domingo, 14 de fevereiro de 2016

À VOLTA DOS EDITORES


Podemos não concordar com as ideias políticas, e outras, de Marcelo Rebelo de Sousa, mas sabemos que é um homem culto, um académico que gosta de livros, que gosta de futebol.

Bem ao contrário da múmia que ainda se passeia por Belém.

O editor José Antunes Ribeiro, dono da Ulmeiro, a histórica livraria da Avenida do Uruguai em Benfica, atravessa momentos difíceis e, ontem, o futuro Presidente da República foi dar um abraço de solidariedade ao José Antunes Ribeiro.

A Ulmeiro, em tempos de ditadura, também depois do 25 de Abril, sempre cumpriu uma missão fundamental: publicar livros que outros editores, por medo-fosse-do-que-fosse, recusaram colocar nas mãos dos leitores.

Assim de repente, lembro-me de As Armas Estão Em Boas Mãos do Capitão Fernandes.

Como a situação financeira da livraria há muito se arrasta, o aumento da renda criou maiores dificuldades, o António Ribeiro, através do facebook, tem vindo a fazer leilão de livros, dos cerca de 200.000 que estão pelas prateleiras, pacientemente organizados por Lúcia, sua mulher.

Pela livraria também se passeia o gato Salvador, terna companhia do Zé Ribeiro e da mulher.

À agência Lusa, contou:

Sou de origem camponesa, não tenho muito esse feitio de estender a mão. Não gosto, não está no meu caráter. Há pessoal que me tem dito ‘fazemos isto e aquilo’. Eu jamais aceitaria qualquer coisa do estilo de esmola. A única coisa que estamos disponíveis é para vender barato. Isso não me importo, para ajudar a resolver o problema”, contou.
Um puto que nasceu numa aldeia onde não se lia, como era o meu caso, numa casa onde não havia livros, com pais analfabetos, que descobriu as bibliotecas itinerantes da Fundação Gulbenkian e uma professora primária, que teve uma influência enorme, optando por vir para Lisboa para ser livreiro-editor.

Às quintas-feiras almoçava com o António Lobo Antunes, tal como conta o escritor, no 3º volume das suas Crónicas, um pedacinho de história que há muito anda para ser Postal ou Quotidianos:

E às quintas-feiras almoço nos Moinhos da Funcheira com o Zé Ribeiro, o Zé Francisco, o Vitorino. Os Moinhos da Funcheira são o subúrbio do subúrbio, depois da Venda Nova, da Brandoa, da Pontinha: toda a gente acha feia e eu acho lindo.

Numa visita à Ulmeiro, perguntei como iam os almoços.

Já quase não se realizam. O António está um chato levado do diabo.

A Ulmeiro fica no nº 13-A da Avenida do Uruguai, ex-libris do bairro de Benfica.

Estão por lá livros importantíssimos, que já não se encontram em parte alguma, a preços que são quase um escândalo de baixo custo.

Merece uma visita.

Passar por lá para ajudar a manter aquele espaço aberto.

É sempre tarde quando se chora.

Quando as livrarias fecham, os cinemas fecham, saltam as lágrimas de crocodilo.

E é sempre tarde, quando se chora.

Legenda: fotografia da Câmara Municipal de Lisboa

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