No dia 29 de
Fevereiro de 1980, José Gomes Ferreira decide tornar-se militante do Partido
Comunista Português.
Na Soeiro
Pereira Gomes é recebido por Carlos Aboim Inglês, responsável pelo Sector
Intelectual.
È esse camarada
que, no Avante de 6 de Março, torna pública a notícia:
Camarada!
Dia 29 de Fevereiro de 1980, pelas cinco e meia da
tarde, chuvosa, caminhaste pelas ruas com o passo firme da tua alma grande e
vieste bater à porta da nossa Casa, na Soeiro Pereira Gomes. Na fala directa de
quem pensou e se decidiu em consciência disseste enxutamente ao que vinhas: que
te aceitássemos como membro do Partido Comunista Português. Aos 80 anos. Em
coerência com toda uma vida, repensada e assumida. Dando resposta combativa a
um presente que não é fácil. De olhos postos, juvenis, no futuro que faremos,
que fazemos.
As tuas palavras, o teu acto, tinha aquele peso e asas
que pões em tudo. Simples, como as coisas verdadeiras do coração. Como um acto
lúcido que se cumpre na hora, por determinação de homem independente que sempre
foste e serás. De homem solidário que és, de raiz – poeta militante,
companheiro dos homens que sofrem, sonham e lutam. E que, juntos como os dedos
da mão, de mãos dadas, hão-de chegar ao fim da estrada e depois hão-de rasgar
as estradas novas de Portugal livre, independente, socialista, para os homens
novos que estão nascendo já.
Ficámos de te dar resposta. E. ressalvando embora a
pública notícia, que não está nos nossos usos, mas que a luta aconselha nestes
tempos de promoção, de crescimento necessário, aqui estamos para te responder
dizendo apenas, com respeito e alegria compartilhada decerto por todo o grande
colectivo fraternal do nosso Partido – que te saudamos, camarada! Abril
vencerá!
Com a sua
pontinha de veneno-inveja, Vergílio Ferreira escreve no 3º volume do seu Conta-Corrente:
Aqui há dias a imprensa noticiou que o José Gomes
Ferreira (aproveitando a circunstância de o ano ser bissexto?) no dia 29 de
Fevereiro se inscreveu no PC. Aqui há semanas, e a propósito de um programa da
TV, levantou-se grande celeuma sobre se Guerra Junqueiro era um poeta maior ou
menos e ventilou-se ainda a questão sobre se ele, à hora do fim, se teria
convertido à Igreja Católica. E, uma vez mais, é curiosos como a história se
repete. Só que, no caso de Gomes Ferreira, ele inscreveu-se mesmo.
Nos seus Dias
Comuns José Gomes Ferreira refere esse velho sonho de se filiar no Partido.
Dos Dias
Comuns estão publicados 7 volumes.
1º Volume:
Outubro de 1990
2º Volume:
Setembro de 1998
3º Volume: Maio
de 2000
4º Volume: Maio
de 2004
5º Volume:
Novembro de 2010
6º Volume:
Janeiro de 2013
7º Volume: Março
de 2015
Sete volumes
publicados em 25 anos.
A caminho dos 71
anos, são nulas as expectativas de que venha a ler os restantes volumes dos Dias
Comuns.
Na Leya
não gostam de livros e apenas entendem a edição como algo que tem de gerar
lucros.
Os livros dos
pivots de televisão, ou treinadores de futebol, qualquer merdunça desde que se
veja o guito.
Quem sabe quem é
o José Gomes Ferreira?
Quem o lê?
É isso!
Pois!
Para sabermos
dos passos diários de José Gomes Ferreira até se tornar militante do partido,
teremos que nos socorrer dos textos desses diários que Raúl Hertnes Ferreira
disponibilizou na Fotobiografia do poeta.
21 de Junho de 1978
Alguns amigos insistem para que eu me inscreva no
Partido Comunista. Tenho resistido até agora e espero resistir.
- Mas tu és comunista – afirmam.
- Pois sou – respondo – Mas tão naturalmente como uma
laranjeira dá laranjas. Sem necessidade de cartão.
17 de Junho de 1979
Alguns jornais falam do meu 80º aniversário do próximo
ano e alguns insinuam que devem condecorar-me.
Como livrar-me dessa condecoração?
Hoje, lembrei-me de me inscrever no Partido Comunista.
Talvez não se atrevam a condecorar um comuna!
28 de Fevereiro de 1980
Hoje resolvi-me e fui pedir ao Aboim Inglês que me
inscrevesse no Partido Comunista Português. Incomodava-me o facto de todos me
considerarem pertencente ao Partido. Isto é, possuir tudo o que era positivo
nele. Quanto aos defeitos evitava-os sem dificuldades.
4 de Março de 1980
Inscrevi-me no Partido Comunista. Exactamente no pior
momento que este partido passa.
Esperei pacientemente pelo dia de hoje.
Também se lê na Fotobiografia
que as últimas linhas dos seus Dias Comuns estão datadas de 25 de Maio de
1980 e fazem parte do 20º volume com o subtítulo A vida Corre sem a
Elegância de uma Gazela.
Repito: pelos
critérios mercantilistas da Leya, e com a idade que vou tendo, quantos
mais volumes irei ler dos Dias Comuns do José Gomes Ferreira?
Uma angústia
desenhada no horizonte do meu caminhar.
Não tenho por
qualquer outro escritor, daqui ou dacolá, a ternura que tenho por José Gomes Ferreira.
Legenda:
Fotografia de José Gomes Ferreira retirada
da Fotobiografia.
Fotografia de José Gomes Ferreira, numa
manifestação de apoio à Reforma Agrária, retirada de Correio do Porto.
Quadro de José Gomes Ferreira pintado por Mário Dionísio.
Quadro de José Gomes Ferreira pintado por Mário Dionísio.
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