- Minha gente – disse o Dr. Copeland, sem expressão, e
depois houve uma pausa. E as palavras acudiram-lhe de repente:
É este o décimo nono ano em que nos reunimos nesta
sala para celebrar o Dia de Natal. Foi uma época sinistra, aquela em que o
nosso povo ouviu falar pela primeira vez do nascimento do Nosso Senhor. Os negros
escravos eram vendidos na praça do tribunal desta mesma cidade. Desde então,
temos ouvido e contado a história da Sua vida um sem-fim de vezes. Assim, hoje
a nossa história vai ser outra.
Há cento e vinte anos, outro homem nasceu num país
conhecido pelo nome de Alemanha… longe, do outro lado do oceano Atlântico. Este
homem compreendia, tal como Jesus Cristo. Mas os seus pensamentos não estavam
dominados pela ideia de céu, ou do destino dos mortos. A sua missão dizia
respeito aos vivos. À grande massa de seres humanos que labutam e sofrem, e
mourejam até à morte. Às pessoas que ganham a vida a lavar roupa, a cozinhar
para os outros, a colher algodão, a trabalhar com as tinas de tinturas escaldantes
nas fábricas. A sua missão dizia-nos respeito a nós, e o seu nome era Karl
Marx.
Karl Marx era um homem de senso, um sábio. Estudou e
trabalhou e compreendeu o mundo em que vivia. Disse ele que a humanidade estava
dividida em duas classes, os pobres e os ricos. Por cada rico havia mil pobres
que trabalham para o tornar mais rico. Não dividiu o mundo em negros e brancos
ou chineses: segundo Karl Marx, ser um dos milhões de pobres, ou um dos poucos
ricos, era mais importante para um homem do que a cor da sua pele. A missão da
sua vida era tornar todos os homens iguais, e repartir as grandes riquezas do
mundo de tal forma que não houvesse mais ricos nem mais pobres, e que cada qual
recebesse a sua quota-parte dos bens do mundo. Eis um dos mandamentos que Karl
Marx nos deixou: «De cada um segundo a sua capacidade, a cada qual consoante as
suas necessidades.»
Carson McCullerrs
em Coração Solitário Caçador
Sem comentários:
Enviar um comentário