terça-feira, 20 de dezembro de 2016

PENA DE POMBO DE TRAFALGAR SQUARE


São belos os seus cadernos de viagem, com todos os pormenores de variados interesses: um bilhete de entrada para um qualquer museu, um bilhete de teatro, a conta da limonada, a fatura do hotel, o bilhete de avião, tudo, tudo com legendas e cheio de explicações. Verdadeiros compêndios artística e sensivelmente organizados para um estudo de imagens, de costumes e pormenores de civilizações diferentes da nossa, álbuns riquíssimos contados quase como num diário de hora a hora.
De ti para nós.
Cuidadosamente anotados, com desenhos por mão própria, fotografias coladas, bilhetes-postais, frases perfeitas, poemas imaginários.
Num desses cadernos de viagem escritos todos os dias ao fim do dia – tal como um artista desenharia as suas impressões de tudo quanto vai vendo -, dedicado a uma visita a Londres, numa das páginas está colada uma pena de pombo. A legenda, no rodapé, é: Pena de pombo de Trafalgar Square.
Poderá parecer inocente, frágil até, esta frase. Contudo, penso nela. Nesta frase não existe a ausência ou a distância. Nem saudade. Existe vida. Tal e qual ela é concebida neste elemento do cosmos em que habitamos e a que chamámos planeta, e ainda por cima, Terra. A pena do tal pombo, apanha numa praça de Londres, ao acaso, é ela própria um microcosmos. Já pertenceu a um corpo de ave que por sua vez pertenceu a um todo. A este todo cósmico.
Meras conjeturas! Simples pensamentos. E quanto mais simples mais complexos. Não foi posta ali nesse caderno por mero acaso. Rómulo, ao recolhê-la e ao fixá-la, quis muito mais do que esse imediato pensamento – Olha! Uma pena de Pombo inglês! Que engraçado! Do que ele se foi lembrar! – Muito mais do que isto! Porque ele sabia o poder da interrogação, o sentimento na dúvida, e, observando a pessoa que era, tudo continha uma intenção pedagógica.
Todos os pássaros têm penas! Esta é a verdade! Esta é uma pena que eu tenho.
Todas as penas são diferentes.

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