sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

JÁ NADA SERÁ COMO DANTES


Já nada será como dantes, diz ele, agora que se aproxima mais um Natal. Aliás vendo bem, há muitos, muitos anos, que já nada era como dantes. E, como sempre, nesta altura do ano, quando começam a acender-se as luzinhas das iluminações das ruas, quando as montras principiam a apelar ao consumo e as pessoas pensam em presentes, festas e reuniões familiares, abate-se sobre ele uma angústia grande, ao recordar outros tempos. Alguém poderia então perguntar: Que fizeste da tua juventude?
Os filmes da infância chegam-lhe à memória. As lágrimas com o Bambi, o divertimento com O Feiticeiro de Oz, a animação de tantas figuras criadas por Walt Disney, a começar num Pinóquio, que ele tinha lido primeiro em livro cartonado, oferta do primo coronel Bento Roma, que até agora tem nome de rua em Lisboa.
Mas, na infância, não eram os filmes que contavam. Era si, a grande família que re reunia, todos os Natais, no casarão da rua Direita, em Chaves. Era um peru cambaleante, bêbedo de jeropiga, nas escadas ao pé da cozinha, o fogão a lenha a brilhar, o cheiro dos doces, a árvore e um presépio e, tantas vezes, lá fora, neve a sério, para dar um toque naturalista. E canções, jogos, os sinos da Matriz a chamarem para a missa do galo.

Eduardo Guerra Carneiro em Outras Fitas

Legenda: pintura de Albrecht Durer

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