segunda-feira, 23 de setembro de 2019

OLHAR AS CAPAS


Pena Suspensa
2º volume de Os Caminhos da Liberdade

Jean-Paul Sartre
Tradução: Amélia Petinga
Capa: José Cândido
Livraria Bertrand, Lisboa, Abril de 1975

Uma mão tocou-lhe no ombro, ele corou de alegria ao reconhecer Brunet.
- Bom dia, meu velho – disse Maurice.
A mão de Brunet era dura e calosa como a sua e apertava com força. Maurice olhou para Brunet e pôs-se a rir com prazer. Despertava: sentia os camaradas a seu lado, e, Saint-Ouen, Ivry, Montreuil, mesmo em paris, em Belville, Montrouge, La Vilette, ombro a ombro, preparando-se para a refrega.
- Que fazes aqui? – perguntou Brunet. – Estás desempregado?
- Estou de férias – explicou Maurice um tanto desajeitado. – Zézette quis vir porque trabalhou aqui antigamente.
- E aqui está Zézette – disse Brunet. – Olá, camarada Zézette.
- É Brunet – disse Maurice. – Leste o artigo dele hoje no Huma.
Zézette olhou para Brunet sem timidez e estendeu-lhe a mão. Ela não tinha medo dos homens, mesmo que fossem burgueses ou os membros mais importantes do partido.
- Quando o conheci era deste tamanho – disse Brunet, designando Maurice. – Estava nos Falcões Vermelhos, no coro; nunca vi ninguém mais desanimado. Por fim, combinámos que ele só fingiria cantar nos desfiles.
Riram-se.
- E então? – disse Zézette. – será que vai haver guerra? Deve saber, está bem colocado para isso.
Era uma pergunta idiota, uma pergunta de mulher, mas Maurice ficou-lhe grato por ela a ter feito. Brunet tinha-se tornado sério.
- Não sei se haverá guerra – disse ele. – O principal, porém, é não ter medo: a classe operária deve saber que não é fazendo concessões que a evitará.
Falava bem. Zézette lançara-lhe um olhar cheio de confiança e sorria docemente enquanto o ouvia. Maurice irritou-se: Bruner falava como o jornal e não dizia nada a mais.
- Acha Que Hitler se amedrontaria se arreganhássemos os dentes? – perguntou Zézette.
Bruner assumira um ar oficial, não parecia compreender que lhe pediam a sua opinião pessoal.
- É muito possível – disse ele. – E depois, aconteça o que acontecer, a U.R.S.S. está connosco.

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