terça-feira, 24 de setembro de 2019

COISAS EXTINTAS OU EM VIAS DE EXTINÇÃO...


Que farei com as minhas cassettes?

Sou um tipo antigo. No meio da parafernália de aplicações que existem ainda ouço cassettes, ainda ouço discos de vinil.

Há uns anos o velho reprodutor de cassettes deu o grande berro.

Não encontrei quem mo reparasse.

Na Feira da Ladra comprei um outro. O rapaz que mo vendeu não me deu grandes garantias. Mas ainda durou três anos. Agora recusou-se a emitir mais sons.

Voltei à velha feira.

O tal rapaz ainda lá está mas não tem nenhum reprodutor para vender. Disse mesmo que depois de me ter vendido o que trouxe para casa, nunca mais lhe apareceram outros.

Perguntei por perspectivas.

Abanou a cabeça.

Que farei com as minhas cassettes?

Aquelas horas e horas em que passei a gravar as mais variadas e espectaculares selecções de música. Sâo 387 cassettes e já não estou a incluir todas as cassettes que gravei para o meu pai.

Quando gravava aquelas cassettes sentia-me membro de um clube exclusivo e em que me espantava, tal  como Groucho Marx, pela existência de um clube que me aceitava como sócio.

Sinto que me invade uma imensa tristeza, uma tristeza sem nome se é que a tristeza precisa de ter nome

Que farei com as minhas cassettes?

Para já, à parte, irei rever High Fidelity, aquele filme de Stephen Frears, saído do livro homónimo de  Nick Hornby.

E enquanto isso não acontece, saco o livro da estante e apresso-me a reproduzir este pedacinho:

«Passei horas a alinhar a cassete. Para mim, gravar uma cassete é como escrever uma carta – tenho de apagar muito, repensar e começar outra vez de início, e eu queria que a cassete ficasse boa, porque… para falar verdade, porque nunca tinha conhecido nenhuma mulher tão promissora como a Laura desde que tinha começado a pôr música, e conhecer mulheres promissoras era parte da profissão.
É difícil fazer uma boa cassete de compilação, tal como é difícil acabar uma relação. É preciso abrir com uma música surpreendente, para captar a atenção (comecei com “Got To Get You Off My Mind”, mas a seguir percebi que ela podia não passar da primeira faixa do lado A se eu desse logo tudo, por isso encaixei-a a meio do lado B), e depois sem se pôr uma mais enérgica ou mais calma, e não se pode misturar música branca com música negra, a menos que a música branca seja parecida com música negra, e não se pode pôr duas faixas do mesmo artista ao lado uma da outra, a menos que se tenha posto todas aos pares, e… oh, há imensas regras.
Seja como for, fartei-me de trabalhar, e ainda tenho meia dúzia de “demos” antigas espalhadas pela casa, cassetes-protótipo em relação às quais fui mudando de ideias. E na sexta-feira à noite, tirei-a do bolso do blusão quando ela veio ter comigo, e seguimos caminho a partir dai. Foi um bom início.»

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