terça-feira, 24 de setembro de 2019

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Li os três volumes de Os Caminhos da Liberdade após os acontecimentos de Novembro de 1975.

Na biblioteca do meu pai existiam os três volumes de Les Chemins de la Liberté, em francês, numa edição da Gallimard. Mas nunca os li porque, ao contrário do tal gato maltês, nunca toquei piano , nem falei francês.

Arrastaram-se os idos de Novembro e Dezembro de 1975.

Um dia, se fará a História.

De quem traiu e o porquê.

Como escreveu Simone Beauvoir:

É horrível assistir à agonia de uma esperança.

Nos primeiros dias do ano de 1976 comprei, na Bertrand do Chiado os três volumes de Os Caminhos da Liberdade.

Enquanto o diabo esfregava um olho, devorei as 1071 páginas que constituem a obra. O meu pai já me tinha dito que a trilogia é largamente autobiográfica e se Mathieu não é Sartre, não sei quem será.

Claro que os acontecimentos de Novembro de 1975 não são para esquecer e não seria a leitura de um livro que permitiria uma situação como essa. Mas foi uma leitura absorvente, cativante, quase inenarrável.

Mário-Henrique Leiria escrevia:

«Porque foi isto assim possível? propomos a explicação de que houve, como "originalidade" típica, muito improviso no processo revolucionário, que esqueceu a sua defesa, criando a alastrando a angústia na pequena burguesia, camada significativa na sociedade portuguesa, a que até muitos trabalhadores as piram por força das motivações que o obscurantismo fascista teve longo tempo para semear.
Angústia semelhante à que agora ressurge com o agravamento das condições de vida, a subida arrogante da reacção, a incerteza do futuro que tem que ser construído de novo.
O Povo terá pois que teimar para que respeitem a sua vontade de acabar com a exploração do homem trabalhador pelo homem esperto. Para que as condições de vida sirvam as classes desfavorecidas. Para que acabem as perseguições aos que olham o futuro sem medo da mudança. parq ue a justiça social deixe de ser uma miragem evangélica no mundo dos mortos. Para quem produz trabalhando, exerça o poder, Para que sejamos verdadeiramente um país Democrático.»

Brunet conversando com o tipógrafo Schneider:

«Os Alemães estão em Paris há quinze dias, toda a França ficou de pernas para or: há camaradas mortos, outros prisioneiros, outros que desapareceram com as suas divisões, outros na cadeia. Se queres saber o que faz o Partido neste momento, vou dizer-te: reorganiza-se.»

Não voltei a pegar em Os Caminhos da Liberdade.

Reli-os agora, em diagonal, para colocar aqui as capas.

Sabe-se que não se lê um livro da mesma maneira, não se toma banho na mesma água.

«Amanhã chegarão os pássaros negros.»

Legenda: Jean-Paul Sartre

2 comentários:

Seve disse...

Nunca li nada do Sartre.

Ó Sammy começo por qual? "As mãos sujas"? Falei neste porque há muitos anos vi um colega de trabalho com esre livro na mão e nunca mais me esqueci - é que, na minha idéia, ele estava nas antípodas do Sarte-

Sammy, o paquete disse...

Dou-me melhor com Albert Camus do que com Jean-Paul Sartre.
Curiosamente «As Mãos Sujas» foi o primeiro livro que li de Sartre, na velha Colecção de Bolso da Europa-América e impressionou-me favoravelmente.
Contudo, há um livro de que gosto muito: «As Palavras». Não sei se ainda é possível encontra-lo porque as editoras, nos dias que correm, não se dedicam a republicar determinado tipo de livros. A minha edição é da Livraria Bertrand.
«Comecei a minha vida como hei-de acabá-la: no meio dos livros..»
Para quem nunca leu Sartre, considero um excelente começo.