terça-feira, 14 de junho de 2022

EXPLORAÇÃO DO LÍTIO


 Ainda estou com o suplemento Ipsilon do Público de 20 de Maio e nele se fala do último livro de José Carlos Barros, escritor pelo qual tenho admiração, principalmente como poeta.

Da crítica a As Pessoas Invisíveis, prémio Leya de 2021, elaborada por José Riço Direitinho, há um passo em que coloca o autor a falar da exploração do lítio, algo que nos últimos tempos tem sido abordado a pontapé por governantes e autarcas:

«Não sei se nós temos ou não que explorar o lítio que há nas serras do Barroso. Provavelmente, sim. É uma discussão mais aprofundada que importa ter. Mas o que sei é que se o lítio estivesse na zona entre o Campo Grande e Alvalade, e se tivesse que ser explorado, que se tratariam as pessoas desse sítio de uma maneira muito diferente daquela como foram tratadas as pessoas de Covas do Barroso, como eu vi. Ou seja, as pessoas de Covas do Barroso não contam para nada nas grandes decisões. O desrespeito que eu vi, ainda sem licenças para a exploração, com o que se fez na prospecção, é uma lástima. Mostra o desprezo que os poderes têm em relação às pessoas do mundo rural, as pessoas que quase não elegem deputados não contam para nada. São invisíveis.”

A exploração de volfrâmio durante a década de 1940, para acorrer ao esforço da guerra de ambos os lados do conflito mundial, atravessa uma grande parte do romance. As consequências sociais, económicas e de alteração dos modos de vida, são por vezes motor das intrigas narradas. De certa forma, e em alguns aspectos que se adivinham, quase que poderia ser feito algum paralelismo com a exploração do lítio que se anuncia para a mesma região. E é isso o que o autor fez: “A minha avó trabalhou nas minas de volfrâmio, o meu tio-avô andava armado nas minas, tinha uma função de guarda. Essas histórias não me são desconhecidas. A minha ambição ao escrever um livro como este foi a de falar também sobre o meu tempo. E a melhor maneira é olhar um bocadinho para trás e tentar perceber como chegámos aqui. Quando falo sobre as minas de volfrâmio e essa obsessão, é porque isso aconteceu e de certa forma está a repetir-se. Falar sobre o volfrâmio nos anos 1940 é falar sobre o lítio hoje. No meu primeiro romance, O Prazer e o Tédio (2009), a história andava muito à volta da florestação e do pinheiro-bravo. Eu vivia no meio da maior mancha contínua de pinheiro-bravo da Europa, segundo se dizia na altura. E descobri que o pinheiro-bravo se tinha começado a plantar à experiência em 1890. Mais tarde, teve um grande incremento com a política de Salazar. Houve um interesse público na industrialização da floresta que era contrário ao interesse das pessoas que viviam nesses lugares. E mais uma vez essas pessoas contaram pouco, eram invisíveis, não entraram nas contas. Mas pagaram a conta.»

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