Ainda estou com o suplemento Ipsilon do Público de 20 de Maio e nele se fala do último livro de José Carlos Barros, escritor pelo qual tenho admiração, principalmente como poeta.
Da crítica a As Pessoas Invisíveis, prémio Leya de 2021, elaborada por José Riço Direitinho, há um passo em que coloca o autor a falar da exploração do lítio, algo que nos últimos tempos tem sido abordado a pontapé por governantes e autarcas:
«Não sei se nós temos
ou não que explorar o lítio que há nas serras do Barroso. Provavelmente, sim. É
uma discussão mais aprofundada que importa ter. Mas o que sei é que se o lítio
estivesse na zona entre o Campo Grande e Alvalade, e se tivesse que ser
explorado, que se tratariam as pessoas desse sítio de uma maneira muito
diferente daquela como foram tratadas as pessoas de Covas do Barroso, como eu
vi. Ou seja, as pessoas de Covas do Barroso não contam para nada nas grandes
decisões. O desrespeito que eu vi, ainda sem licenças para a exploração, com o
que se fez na prospecção, é uma lástima. Mostra o desprezo que os poderes têm
em relação às pessoas do mundo rural, as pessoas que quase não elegem deputados
não contam para nada. São invisíveis.”
A exploração de
volfrâmio durante a década de 1940, para acorrer ao esforço da guerra de ambos
os lados do conflito mundial, atravessa uma grande parte do romance. As
consequências sociais, económicas e de alteração dos modos de vida, são por
vezes motor das intrigas narradas. De certa forma, e em alguns aspectos que se
adivinham, quase que poderia ser feito algum paralelismo com a exploração do
lítio que se anuncia para a mesma região. E é isso o que o autor fez: “A minha
avó trabalhou nas minas de volfrâmio, o meu tio-avô andava armado nas minas,
tinha uma função de guarda. Essas histórias não me são desconhecidas. A minha
ambição ao escrever um livro como este foi a de falar também sobre o meu tempo.
E a melhor maneira é olhar um bocadinho para trás e tentar perceber como
chegámos aqui. Quando falo sobre as minas de volfrâmio e essa obsessão, é
porque isso aconteceu e de certa forma está a repetir-se. Falar sobre o
volfrâmio nos anos 1940 é falar sobre o lítio hoje. No meu primeiro romance, O
Prazer e o Tédio (2009), a história andava muito à volta da florestação e
do pinheiro-bravo. Eu vivia no meio da maior mancha contínua de pinheiro-bravo
da Europa, segundo se dizia na altura. E descobri que o pinheiro-bravo se tinha
começado a plantar à experiência em 1890. Mais tarde, teve um grande incremento
com a política de Salazar. Houve um interesse público na industrialização da
floresta que era contrário ao interesse das pessoas que viviam nesses lugares.
E mais uma vez essas pessoas contaram pouco, eram invisíveis, não entraram nas
contas. Mas pagaram a conta.»
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