quinta-feira, 23 de junho de 2022

WE''LL MEET AGAIN


Poucas canções nos surgem tão coladas a um tempo e a um contexto histórico como “We’ll Meet Again”, que os compositores ingleses Ross Parker e Hughie Charles escreveram em 1939 e Vera Lynn cantou em 1942 e voltaria a cantar no ano seguinte no filme com o mesmo nome, realizado por Philip Brandon. 

A sua letra é a seguinte: 

“We'll meet again,
Don't know where, don't know when,
But I know we'll meet again
Some sunny day.
Keep smiling through,
Just like you always do,
'Till the blue skies drive the dark clouds far away.

So will you please say hello
To the folks that I know,
Tell them I won't be long.
They'll be happy to know
That as you saw me go,
I was singing this song

We'll meet again,
Don't know where,
Don't know when,
But I know we'll meet again,
Some sunny day.”

 Numa Europa já espezinhada pela barbárie nazi e numa Inglaterra que tinha acabado de atravessar talvez os tempos mais dramáticos da sua História coletiva (o “Blitz”), esta música era um grito de esperança em relação ao futuro. Não era hora para grandes choros nem para profundas lamentações. Pelo contrário, haveria que erguer a cabeça e continuar a lutar mantendo um sorriso no rosto, porque as nuvens escuras passariam, o céu voltaria a ficar azul e, por muito tempo que isso pudesse levar, aqueles que agora partiam para a Guerra iriam regressar e todos se encontrariam juntos, de novo, num radioso dia de Sol.

Não foram só os discursos de Churchill… Não foi, apenas, com o sangue, o suor e as lágrimas… Coisas como esta também contribuíram - e muito… - para forjar a resistência de toda uma nação. 

Refiro-me mais à canção do que ao filme, claro está, porque este é muito pobrezinho e quase só existe para se aproveitar dela, embora se revista de um inequívoco interesse histórico.

 No filme - muito pouco visto por estas bandas -  Vera Lynn é Peggy, uma jovem bailarina que, numa noite em que os espectadores do teatro onde trabalha são obrigados permanecer no interior das instalações para se protegerem do “blitz”, é levada a cantar para os entreter, e, embora o faça a contragosto, demonstra tal qualidade que, passado pouco tempo, a veremos já  como grande vedeta da BBC a cantar para as tropas do seu país.  

Todas as canções do filme seguem a mesma linha temática de “We’ll Meet Again”.

“After de Rain”, que é uma das mais repetidas, já se percebe no que irá dar… Depois da chuva surgirá, certamente, um céu azul e um sol radioso…

“Sincerely Yours” é a explicitação da devoção de Vera Lynn aos soldados e ao esforço de guerra. Por si só, é todo um programa:

“When life seems a dull December

And you need sympathy

A smile and a kind word or two will always help you through

And so I promise you

I’m yours sincerely

I want you to know I’m really forever sincerely yours

Should cares betide you

You know I’ll be there beside you

Forever sincerely yours

If you need a someone

To help you along with a smile and a song

I’m your sincerely

Whatever befalls

I’m really forever sincerely yours” 

 E até uma pequena canção de embalar se transforma, no filme, num hino à esperança.

O filme termina com a cena que vos mostro, onde se vê  já não Peggy, mas claramente Vera Lynn a cantar “We’ll Meet Again”para uma imensidão de soldados da RAF.

E foi isto que, na realidade, Vera Lynn fez durante os anos que se seguiram, como também já o havia feito antes. Cantou para os soldados ingleses um pouco por todo o Mundo, em África, na Ásia, na Oceânia... Ficaria, para sempre, nos corações de gerações e gerações de ingleses, sobretudo os veteranos da guerra (por isso lhe chamavam “Forces Sweetheart”…) e viria a receber as mais altas condecorações atribuídas a cidadãos britânicos.

A 18 de Junho, dois anos que faleceu, com a bonita idade de 103 anos, não sem que antes lhe tenha sido concedida uma nova e significativa honraria: ter sido eleita, no ano 2000, a cidadã britânica que melhor encarnou o espírito do Séc. XX.  

Em 1979 os Pink Floyd evocaram-na no duplo álbum “The Wall” com uma curta canção (chamemos-lhe assim…) chamada “Vera”, que surge imediatamente colada a outra que se chama, apropriadamente, “Bring the Boys Back Home”, naquela que é uma evocação desses tempos de Guerra por parte de Pink, que parece ser um alter-ego de Roger Waters nesse concept album. Não lhe acho muita graça e só o refiro aqui a título de curiosidade, para que se perceba a que ponto chegou a importância de Vera Lynn no imaginário coletivo dos ingleses.

Mas curiosidades é coisa que não falta em torno de “We’ll Meet Again”…  

Oitenta anos mais tarde esta canção seria de novo evocada em Inglaterra pela própria Rainha,  numa clara mensagem de esperança,  a propósito da necessidade de toda a Nação se unir para superar um novo e assustador perigo coletivo: a Covid...

Muitos anos antes, no auge da Guerra Fria, parece que esta terá sido uma das gravações que a BBC guardou a sete chaves em subterrâneos para que pudesse, posteriormente, voltar a insuflar ânimo àquela parte da população que viesse a sobreviver a um ataque nuclear…

E talvez até tenha sido por ter ouvido falar nisso que, em pleno rescaldo da Crise dos Mísseis de 1962, Stanley Kubrick, que nunca foi muito de ver o Mundo a cor-de-rosa, utilizou esta mesma canção para simbolizar, já não a esperança, mas o medo de um conflito nuclear, que é, precisamente e por muito que não queiramos nisso acreditar, o que paira no nosso horizonte nos dias de hoje. 

Com efeito, foi “We’ll Meet Again” a canção que ele escolheu para concluir o seu “Dr. Strangelove”, de 1964, enquanto no ecrã passam as imagens de um desastre nuclear. Não poderia haver maior ironia e maior contraste…

Em 1965, em pleno início da Guerra do Vietname, também os Byrds recorreram a esta música, numa das mais estranhas e intrigantes opções de todo o seu vasto repertório, transformando-a, com as suas rajadas de guitarras elétricas,  num sucesso do Pop/Rock. De novo o medo da guerra e a esperança em dias melhores, ou mera reação oportunista ao filme do Kubrick do ano anterior…?   


Quem também a interpretou, na última sessão de gravações que fez pouco tempo antes de falecer, foi Johnny Cash.

Mas aí tenho a certeza de que ele não estava a pensar em soldados e na guerra, nem, tão pouco, em qualquer possível desastre nuclear.

O velho e católico Johnny Cash não poderia adivinhar que a sua muito amada mulher, June, lhe iria desaparecer poucos meses depois e que ele próprio poucos tempo mais lhe iria sobreviver. Mas quando pediu aos membros da sua Família para se juntarem a ele na gravação dessa canção, aposto que estaria a pensar que seriam eles e, acima de tudo, a sua querida June, quem ele tinha a certeza de que iria voltar a encontrar nesse tal dia de céu azul e de muito Sol.

 Como é que eu sei…? 

Porque ele se descaiu e, na parte final declamada, diz: “So Honey keep smilin’thou just like you always do…”. Esse “Honey” não existe em lado nenhum na letra da música nem em nenhuma das muitas versões que conheço. Foi ele que o introduziu, deliberadamente… Porque é para June que está a fala, nessa derradeira e pública declaração de Amor… 

E quanto a nós…?

Veremos algum dia as nuvens negras passar…?

Will we ever meet again…?

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