Talvez que quando eu for velho, reduzido aos meus relógios e aos meus
gatos num terceiro andar sem elevador, conceba o meu desaparecimento não como o
de um náufrago submerso por embalagens de comprimidos, cataplasmas, chás
medicinais e orações ao Divino Espírito santo, mas soba forma de um menino que
se erguerá de mim como a alma do corpo nas gravuras do catecismo, para se
aproximar, em piruetas inseguras, do negro muito direito, de cabelo esticado a
brilhantina, cujos beiços se curvam no sorriso enigmático e infinitamente
indulgente de um buda de patins.
António Lobo Antunes em Os Cus de Judas
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