Há dias, num artigo publicado no Diário de Notícias, Mário Soares cirandava à volta da ideia de um certo direitismo de António José Seguro:
O povo português é um grande povo e não se engana. Viu-se nas
últimas eleições, em que a esmagadora maioria não votou apesar do seu apelo nem
perdoou ao PS, cujo líder é António José Seguro, ter estado ou à direita ou
crítico da direita, conforme as situações. Mas nunca claramente à esquerda,
como foi sempre a posição do PS desde que se tornou um partido em 1973, data da
sua constituição. E, por isso, perante a crise atual nunca passou dos 30 e
poucos por cento. Resultado inaceitável para um partido como o PS, se estivesse
realmente à esquerda.
Goste-se ou não de António José Seguro, Mário Soares será,
provavelmente, o último dos dirigentes a poder invocar que o PS é um partido de esquerda ou, para ir
um pouco mais longe, um partido socialista.
Quarenta anos talvez ainda não seja tempo suficiente para
que muitos portugueses tenham perdido a memória e não se recordem do não
socialismo de Mário Soares.
Em 6 de Março de 1998, o sempre pouco credível Vasco Pulido
Valente escreveu um artigo em O Independente que intitulou:
O Partido Socialista nunca existiu.
A matriz do partido sempre foi social-democrata, puxando
como conveniente aliado o SPD de Willy Brant e o socialismo apareceu como mero e
puro oportunismo político.
Quando fizeram saber a Mário Soares das movimentações no
seio das Forças Armadas, saltou de imediato a ideia de que não havia tempo a perder.
Solicitado apoio logístico e material ao SPD alemão, vinte
personalidades, onde abundam advogados e outras profissões liberais, não há um
operário ou algo que por lá perto ande, fundam, em 19 de Abril de 1973 em
Bad Munstereifel, o Partido Socialista
Português.
Amigos idos de Portugal, a que se juntaram diversos exilados
políticos espalhados pela Europa, acabaram por não ser unânimes na transformação da Acção Socialista
Portuguesa em partido, mas Soares já tinha declarado o objectivo de «não
perder tempo para nos assumirmos como partido logo às primeiras horas da queda
do fascismo»
Mário Soares, por ocasião do quarto aniversário do PS:
O apoio do SPD alemão foi enorme. Estivemos reunidos na Alemanha em
condições excepcionais, de ambiente formidável, durante vários dias, num quadro
de facto paradisíaco, no meio de uma floresta, numa casa que tem a fundação,
próxima do Partido Social Democrata, justamente para reuniões dos quadros do
SPD.
Da Declaração de Princípios aprovada no I Congresso do PS, Dezembro de 1974:
Etelvina Lopes de Almeida, no decorrer do
I Congresso do PS:
Somos orgulhosamente marxistas.
Julho de 1977, Jean-Pierre Chavenement, durante o Congresso
do Partido Socialista Francês, propõe que o lema do partido seja;
Nem perecer como no Chile, nem trair como em Portugal.
Em Julho de 1975, para encher a Fonte Luminosa, Mário Soares
solicita ao Cardeal Patriarca, D.António Ribeiro, para que os púlpitos das
igrejas sejam utilizados para convocar gente para a grande manifestação contra o avanço dos comunistas e da extrema-esquerda.
De uma citação do Diário de Lisboa de 25 de Outubro de 1975:
Em Outubro de 1979, Mário Soares garantia que o seu encontro
com D. Júlio Rebimbas, Bispo de Viana do Castelo, apenas visava combater uma campanha tendenciosa que tem
vindo a ser feita por certos sectores reaccionários no sentido de englobarem o
PS nas partidos marxistas.
Em 25 de Novembro de 1982 para Mário Soares o
marxismo está ultrapassado e não tem futuro na Europa do sul sendo portanto objectivo
a curto prazo «desmarxizar» o programa do partido.
Almeida Santos em Janeiro de 1983:
O PS não é, nem pelo seu programa, nem pela sua prática política, um
partido marxista.
A estrutura local de Matosinhos do PS coloca em comunicado
que a
eliminação da palavra “marxismo” irá contribuir decisivamente para uma maior
implantação do PS no seio do povo português.
Num artigo de opinião, publicado em O Jornal de 28 de Outubro
de 1983, Eduardo Lourenço escreve:
O insólito tema da «des-marxização», se tem algum sentido só pode ser
este: o de evitar, com tão estapafúrdia querela, o verdadeiro debate que não é
outro senão o do socialismo do chamado Partido Socialista. Não é, pois, de
impossível desmarxização que se trata, mas da trivialíssima dessocialização, a
fim de, uma vez por todas, se pôr de acordo o comportamento histórico, político
e social do PS e a sua linguagem. Mentir sempre também cansa.
Mário Soares já tem feito milagres maiores. Não há razão nenhuma para
pensar que não é capaz de inventar um partido socialista sem uma onça de socialismo.
No decorrer do VI Congresso, o que já fora ameaça no V Congresso,
tornou-se realidade: Karl Marx é fechado na gaveta, um mudar de página porque os
tempos são outros diz Soares.
Henrique Monteiro em O Jornal:
Karl Marx, era um velho militante socialista que há mais de dez anos
deixara de pagar as quotas. Finalmente, neste congresso, ficou reconhecido que
estava, definitivamente, afastado do PS.
No já citado artigo de O Independente, Vasco Pulido Valente lembra
que Soares não meteu o socialismo na gaveta, porque nunca o tinha tirado de lá.
Víítor Constâncio em Julho de 1986:
PS é o único partido português que traduz a social-democracia.
Claro que nas jotas, de onde provém a esmagadora maioria dos
imberbes, impreparados e irresponsáveis políticos e governantes que nos
assistem, miudezas destas, outras coisas mais, são desconhecidas.
Daí que as graçolas de Mário Soares sobre António José Seguro terem ficado sem a denúncia e a discussão que mereciam.
É por isso que não há qualquer ponta de espanto no pantanoso estado a que chegámos.
Daí que as graçolas de Mário Soares sobre António José Seguro terem ficado sem a denúncia e a discussão que mereciam.
É por isso que não há qualquer ponta de espanto no pantanoso estado a que chegámos.
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