terça-feira, 27 de março de 2018

OLHAR AS CAPAS


O Sorriso Aos Pés Da Escada

Henry Miller
Prefácio: Vitor Silva Tavares
Tradução: Célia Henriques e Vitor Silva Tavares
Capa: Tocha de Sousa
Editora Ulisseia, Lisboa, Dezembro de 1966

Todas as noites, ao aplicar o maquillage, Augusto discutia com os seus botões. As focas, não importa o que fossem obrigadas a fazer, permaneciam sempre focas. O cavalo, um cavalo; a mesa, uma mesa. Augusto, embora permanecendo um homem, era obrigado a tornar-se em algo mais: tinha de assumir os poderes de um ser excepcional dotado de um excepcional talento. Tinha de fazer rir as pessoas. Não era difícil fazê-las chorar, tão-pouco fazê-las rir; descobrira isso há muito tempo, antes mesmo de sequer ter entrado para o circo. Mais altas, porém, eram as suas ambições – queria dotar os espectadores de uma alegria que se revelasse imperecível. Foi esta obsessão que primeiramente o levou a sentar-se aos pés da da escada e simular o êxtase. Caindo, por mero acaso, na imitação de um transe – esquecera-se do que iria fazer a seguir. Quando voltou a si, um tanto confuso e em extremo apreensivo, encontrou-se a ser aplaudido freneticamente.

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