Pode ser da
minha vista, mas tenho a opinião de que Objecto Quase é um livro bem
interessante. Difícil, é certo, mas interessante.
José Saramago numa entrevista
publicada no semanário Extra de 1 de Junho de 1978:
«Com o Objecto
Quase quis fazer um livro contra a alienação e creio tê-lo conseguido. Não é
um livro fácil. Fácil seria não passar do primeiro grau da denúncia e apostar
na preguiça do leitor. Não o fiz e nunca farei. O leitor também escreve o livro
quando lhe penetra o sentido, o interroga. Ler um livro não é ver televisão. O
leitor não pode ser esponja inerte que absorve sem esforço nem escolha tanto a
água pura como as piores poluições. «Objecto Quase» é um livro com o
qual e contra qual o leitor tem de lutar.»
É isto que torna
José Saramago um escritor que apetece ler, mesmo que com dificuldade as páginas
se ultrapassem, chega-se a um final feliz pelo desafio que o escritor nos
lança.
Maria Alzira
Seixo: «Trata-se de um conjunto de contos onde fantástico e certas componentes
da ficção científica se misturam, criando uma atmosfera conjunta de maravilhoso
que muitas vezes se constrói a partir de uma fissura insólita, ou desmesurada,
do mais banal quotidiano ou do acontecimento mais efectivamente demonstrável.»
O livro guarda o
conto «Cadeira» que é uma variação literária e política sobre esse
momento histórico em que Salazar se lança para uma cadeira de lona, espalha-se
e bate com a cabeça no empedrado da esplanada do Forte de Santo no Estoril.
«Já aí vêm buscar o velho. Aquele raspar de unhas,
aquele choro, é das hienas, não há ninguém que não saiba. Vamos até à janela.
Que me diz a este mês de Setembro? Há muito tempo que não tínhamos um tempo
assim.»
Peguemos agora
nas linhas que Joaquim Vieira em Rota de Vida dedica a Objecto
Quase.
Palavras que provém de conversas com o editor Nelson de Matos e um
tal Carlos que se diz amigo de Saramago.
As palavras do
editor reflectem a circunstância de ter privado política e literáriamente com
José Saramago e permitido que o futuro Nobel da Literatura batesse à porta de
um concorrente e este tenha apostado no então escritor desconhecido. São palavras
que nascem de uma infindável dor de cotovelo. Quanto ao tal «amigo»… fácil se torna concluir que a amizade não passeia
por ali.
«A memória que Nelson de Matos conserva da sua segunda
experiência editorial com a obra de Saramago é que «as críticas ao Objeco Quase
foram todas más – e o livro era mauzote»: «Ainda foi pior que o primeiro, um
insucesso total, Foi pior a sensação que tive com o Objecto Quase, que me pôs completamente
os cabelos em pé, porque esse eu achei um péssimo livro, mas também o
publiquei.»
Não era mais encomiástica a apreciação de Carlos Duarte
a Objecto Quase: «Nós mantínhamos uma boa relação de amizade, nessa altura em
que ele passou as passas do Algarve. Lembro-me de que Saramago publicou um
livrinho de contos, que me ofereceu, e eu cheguei a casa e disse à minha
mulher: “Coitado do Zé, ele não tem futuro como escritor”.»
2 comentários:
Realmente é isto que torna José Saramago um escritor que apetece ler. É por isso que digo e repito que Saramago é o melhor escritor português depois de Camões (e não digo melhor para eventualmente ressalvar um pouco da minha imensa ignorância).
A propósito de Saramago, ainda ontem na RTP1 vi um imbecil a (tentar) entrevistar uma mulher inteligente (Pilar) e a dizer baboseiras atrás de baboseiras, absolutamente incapaz de manter uma conversa sobre um tema que poderia ter dado pano para mangas, e que vi com muita tristeza ser absolutamente intratado por, repito, um completo imbecil. Uma tristeza!
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