sexta-feira, 2 de março de 2012

COISAS EXTINTAS OU EM VIAS DE...



É discutível a frase que diz que não devemos voltar aos lugares onde fomos felizes.

Quando soube do fim próximo, aquiaqui da Livraria Portugal, disse para comigo que voltaria lá, olhar, pela última vez, aquelas estantes, os escaparates, a escada ao fundo que dava para o primeiro andar, comprar (mais) livros.

Acabei por não voltar.
O fecho de uma livraria é, para quem gosta de livros, e não só, um osso muito duro de roer,  e a Livraria Portugal acompanhou o meu crescimento neste caminho longo e feliz em busca da cultura possível.

Disse alguém, de que agora não lembro, e isto, hélas!, cada vez me acontece mais: se não sabes despedir-te diz que já voltas.

Uma notícia do Público revelava que foi uma gramática, Gramática e Linguistica, comprada por uma professora, a viver em França, mas sempre que vinha a Lisboa visitava a livraria, foi o último livro a ser vendido.

Esta melancolia assanhada pelo fechar de portas da Livraria Portugal, levou-me a trazer até aqui, um texto que a poetisa Maria do Rosário Pedreira escreveu no se blogue Horas Extraordinárias sobre esse mundo das livrarias da Baixa, que vai morrendo aos poucos:

Oh, que saudades do meu pai, e de ser pequenina, e de viver num Portugal se calhar tão pobre como este, mas sem nenhuma consciência disso. Que saudades de ir pela mão dele à Baixa ver as iluminações de Natal – que nesse tempo só lá é que as havia. Que bom tirar a fotografia com o Pai Natal à porta do Hotel Avenida Palace, escolher depois um presente na loja de brinquedos do italiano da Rua do Ouro e, em frente a uma montra cheia de chapéus-de-chuva, lanchar na Pastelaria Ferrari, onde havia batidos de ananás divinos e muitos espelhos para olhar o mundo. Oh, que saudades de ser criança e subir o Chiado pela mão do meu pai, de passar a loja de tecidos donde a minha mãe trazia amostras de fazendas de xadrez para os kilts da minha irmã e pedia descontos; e que bom era – afinal, o melhor momento do passeio – quando o meu pai, muito vaidoso, ia provar um fato novo cortado pelo alfaiate do Picadilly e eu podia esperar, sem medo de pedófilos, na Livraria Bertrand, onde metia o nariz nos livros e andava de sala em sala a ver tudo, como numa espécie de museu… Hoje, o País continua triste, e pobre, mas temos pronto-a-vestir e refrigerantes de lata; já não resta quase nada do que compunha essa viagem bonita, nem me resta o meu pai. A única coisa que tenho, apesar de tudo, ainda é a Bertrand.

Sem comentários: