terça-feira, 23 de junho de 2015

OLHAR AS CAPAS


Um Eremita em Paris

Italo Calvino
Tradução: José Colaço Barreiros
Capa: Fernando Mateus
Editorial Teorema, Lisboa, s/d

Agora devo ter mudado qualquer coisa, só escrevo bem num local que seja meu, com livros ao meu alcance, como se tivesse sempre necessi9dade de consultar não se sabe bem o quê. Talvez não seja pelos livros em si, mas por uma espécie de espaço interior que eles formam, quase como se me identificasse a mim próprio como uma minha biblioteca ideal.
No entanto, uma biblioteca minha nunca consigo tê-la junta: os livros tenho-os sempre uns para cada lado; quando preciso de consultar um livro em Paris é sempre um livro que eu tenho em Itália, quando em Itália tenho de consultar um livro é sempre um livro que tenho em Paris. Esta necessidade de consultar livros ao escrever é um hábito que ganhei digamos há uma dezena de anos; dantes não era bem assim: no que eu escrevia, tudo tinha de vir da memória, tudo fazia parte do vivido. Até qualquer referência cultural tinha de ser algo que eu trazia cá dentro, que fazia parte de mim mesmo, senão não entrava nas regras do jogo, não era material que eu pudesse pôr na folha. Em contrapartida agora é exactamente o contrário: até o mundo se tornou uma coisa que eu consulto de quando em quando, e entre esta estante e o mundo lá fora já não há aquele salto que parece existir.

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