sábado, 20 de junho de 2015

OS IDOS DE JUNHO DE 1975


20 de Junho de 1975

JÁ PASSARAM uns dias, foi a 15, que Otelo Saraiva de Carvalho, citado por O Primeiro de Janeiro, explosivamente afirmou. oxalá que, realmente, não tenhamos que um dia encher a arena do Campo Pequeno com muitos contra-revolucionários, antes que os contra-revoluciojnários nos metam a nós no Campo Pequeno.
Em entrevista à Rádio Renascença, já dissera: eu, às vezes, chego a apensar que a nossa inexperiência revolucionária, enfim, teria sido melhor se, em 25 de Abril de 1974 encostássemos à parede ou mandássemos para o Campo Pequeno umas centenas ou uns milhares de contra-revolucionários, eliminando-os à nascença. Tenho a impressão de que neste momento a contra-revolução já não existia, pelo menos, por medo. Nós sfazer uma revolução humanista, uma revolução de cravos, uma revolução muito bonita, e estamos agora com um esforço tremendo para a conseguir levar a cabo,


O REPÚBLICA É REABERTO. A admistracção, o director e os redactores pró-Raul Rego, não chegam acordo com os restantes trabalhadores, no tocante à publicação do jornal, e abandonam as instalações.
O «Caso República” está num beco sem saída e pode levar a uma crise muito grave, disse Mário à rádio francesa Europe 1.

Os jornalistas distribuem um comunicado:


PRÓ E CONTRA manifestantes, por causa do caso Rádio Renascença, envolveram-se em confrontos frente ao Patriarcado.
Viveram-se momentos de forte tensão e houve a necessidade da intervenção das Forças Armadas.
Sottomayor Cardia, em nome do Partido Socialista, solidarizou-se com a Igreja Católica e o seu direito de utilizar os meios de comunicação social. A demagogia irresponsável e anticlerical movida a respeito do caso Renascença apenas pode favorecer a contra-revolução e o fascismo.
Por seu lado, também em comunicado, o Partido Comunista diz que a luta que os trabalhadores da Rádio Renascença têm conduzido por algumas justas reivindicações profissionais não têm encontrado por parte da hierarquia da Igreja qualquer perspectiva de solução - é uma luta que se tem prolongado e ultimamente agudizado.
As reivindicações profissionais defendidas não devem ser confundidas com qualquer questão religiosa mas existem forças que se mostram interessadas em criar e alimentar tal confusão.


O EPISCOPADO português, tão silencioso e conivente com a ditadura, em nota pastoral, intromete-se, negativamente, na situação política.
Do Apontamento de José Saramago no Diário de Notícias:
Se os bispos portugueses, defendessem a Revolução, portugueses seriam, mas não bispos. Teriam inventado, se tal milagre se desse, uma nova maneira de ser bispo, mais preocupada com a liquidação das misérias do mundo em geral e dos povos (deste povo) em particular, do que com a defesa já mal disfarçada de um fixismo social e económico que certas encíclicas pareceram combater e, afinal, reforçou na prática.

MIGUEL TORGA no seu Diário:
Estranha revolução esta, que desilude e humilha quem sempre ardentemente a desejou. A mais imunda vasa humana a vir à tona, as invejas mais sórdidas vingadas, o lugar imerecido e cobiçado tomado de assalto, a retórica balofa a fazer de inteligência. Mas teimo em crer que apesar de tudo valeu a pena assistir ao descalabro. Pelo menos não morro iludido, como os que partiram nas vésperas do terramoto. Cuidavam que combatiam pelo futuro e, na verdade, assim acontecia, mas apenas na medida em que o sonhavam como se ele tivesse de ser coerente com a dignidade do seu passado de lutadores. O trágico é que um futuro sonhado não passa de uma ficção. O tempo é o lugar do inédito. O futuro autêntico é sempre misteriosos e autónomo das premissas de que partiu. Quando chega, traz os seus valores, as suas leis, a sua gente, nem boa nem má. Traz os títeres que lhe convêm. Ou pior: os títeres a quem a hora convém.


Fontes:
- Acervo pessoal;
Os Dias Loucos do PREC de Adelino Gomes e José Pedro Castanheira.
- Diário de Miguel Torga
-Os Apontamentos de José Saramago

Legenda: confrontos em frente do Patriarcado. Fotografia tirada de - Os Dias Loucos do PREC.

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