segunda-feira, 15 de junho de 2015

O QU'É QUE VAI NO PIOLHO?


Karin no final de Stromboli, a história de uma pecadora tocada pela graça, no dizer de Eric Rohmer:

Deus! Oh! Meu Deus! Ajuda-me! Dá-me força, a compreensão e a coragem.

Este é o primeiro de seis filmes que Rossellini fez com Ingrid Bergman.

Uma mulher sofreu a experiência da guerra; sai dela martirizada e endurecida, sem saber mais o que é um sentimento humano. O importante era saber se esta mulher ainda pode chorar, e o filme acaba por aí: quando caem as primeiras lágrimas.

Sobre Ingrid, João Bénard da Costa escreveu:

Por ela, os vulcões deitaram lavas.

E no tempo da sua morte:

A 29 de Agosto de 1982 – no dia em que fazia 67 anos – morreu com um cancro. Aí, o ciclo fechou-se sobre esta doce e dupla mulher que, em luz e sombra, acendeu os mais obscuros fantasmas dos nossos desejos. E julgo que posso falar não só em nome da minha vida, como em nome da vida de todos quantos – nascidos entre 1925 e 1945 – pegaram na mão dela para percorrer o mais proibido e apetecido dos quantos obscuros.

Conta-se que fez o filme sem ter um guião e apenas um bloco-notas com algumas ideias. Aconteceu um dos mais extraordinários filmes da história do cinema.

 Robert Altman também era avesso a guiões. Quando lhe perguntaram para que é que serve um guião ele respondeu: para saber se há cavalos ou não.


Em Novembro de 1973 a Fundação Calouste Gulbenkian organizou uma retrospectiva da obra de Roberto Rossellini. A ditadura marcelista estava já no seu estertor e o acontecimento faz parte da memória de cinéfilos e dos que estvam contra a ditadura. O ciclo começou no Grande Auditório, às 21,30 Horas com Roma Cidade Aberta.

Diz, quem por lá esteve, que foi das manifestações mais extraordinárias que por aquele tempo aqui aconteceram.

 Estou neste momento a olhar para a página de publicidade paga da retrospectiva, publicada em O Cinéfilo de 15 de Novembro de 1973 o onde se pode ler, para além dos filmes a exibir, indicações como programas sujeitos a alteração, o calendário da bilheteira: assinantes dia 13, Início da venda avulso dia 15, assinaturas para os 27 espectáculos 200$00, bilhetes para cada espectáculo 10$00 e ainda a classificação dos espectáculos: Grupo D (Maiores de 18 anos).

No mesmo número de “O Cinéfilo” pode ler-se: Grande número de filmes vão ser vistos, no Auditório 2 por 300 e tal privilegiados, convidados ou assinantes. À porta da Gulbenkian ficam os outros.

Nos filmes de Rossellini feitos com Ingrid Bergman é possível ver o quanto eles são verdadeiros actos de amor de um pelo outro.

Mais tarde, já não foi tanto assim.

Foi depois de ter visto dois filmes de Rossellini, que Ingrid se determinou que tinha de fazer um filme com o realizador, e escreveu-lhe oferecendo-se de corpo e alma:

Caro Senhor Rossellini,

Vi os seus filmes «Roma Cidade Aberta» e «Libertação» de que gostei muito. Se precisar de uma actriz sueca que fala muito bem inglês, que não esqueceu a língua alemã, que não é muito fluente em francês e que, em italiano, só sabe dizer «Ti amo», estou pronta a fazer um filme consigo.
Com os melhores cumprimentos,
Ingrid Bergman


Rossellini nunca tinha ouvido falar de Ingrid Bergman mas escreveu-lhe a dizer que quando entendesse poderia aparecer por Itália.

Logo que ficou livre dos compromissos que tinha entre mãos voou para Itália e apalavraram fazer um filme em tempo oportuno.

Na altura Roberto Rossellini vivia com Anna Magnani.

Conta a lenda que Ana Magnani quando soube que o próximo filme de Rossellini não constava do elenco, perguntou como era.

 Estavam num restaurante e Rossellini começou a entaramelar a língua.

 Anna Magnani não pensou duas vezes e espetou-lhe com uma travessa de esparguete na cara.

Ingrid Bergmann deixa um marido e uma filha.

Com Rossellini fará seis filmes, têm três filhos e separam-se em 1956.

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