De Profundis, Valsa Lenta
José Cardoso
Pires
Prefácio: João
Lobo Antunes
Capa: Emília
Abreu
Publicações Dom
Quixote, Lisboa, Maio de 1967
Janeiro de 1995, quinta‑feira. Em roupão e de cigarro
apa‑ gado nos dedos, sentei‑me à mesa do pequeno‑almoço onde já estava a minha
mulher com a Sylvie e o António que tinham chegado na véspera a Portugal. Acho
que dei os bons‑ ‑dias e que, embora calmo, trazia uma palidez de cera. Foi
numa manhã cinzenta que nunca mais esquecerei, as pessoas a falarem não sei de
quê e eu a correr a sala com o olhar, o chão, as paredes, o enorme plátano por
trás da varanda. Parei na chávena de chá e fiquei. «Sinto‑me mal, nunca me
senti assim», murmurei numa fria tranquilidade. Silêncio brusco. Eu e a chávena
debaixo dos meus olhos. De repente viro‑me para a minha mulher: «Como é que tu
te chamas?» Pausa. «Eu? Edite.» Nova pausa. «E tu?» «Parece que é Cardoso
Pires», respondi então.
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