Até ouço dizer que a velhice é boa coisa, tem
encantos, prazeres, eu pergunto quis. Saber um pouco mais, ser menos limitado,
menos preconceituoso? De que adianta se a vida já se vai e a experiência não
serve a nada nem servirá a outem, experiência não se herda, não se doa em
testamento.
A quantas misérias o homem se vê sujeito quando a
idade pesa e o passo se faz trôpego, vacilante. Sem quere falar na solidão, a
que tantos estão condenados na velhice, basta pensar no desencontro entre o
desejo e a competência nas comarcas do leito: o desejo embacia os olhos, queima
o peito, desce aos quimbas e os quimbas pururucas cumprem mal o seu dever, se é
que o cumprem.
O douto descobrirá no ocaso da vida o prazer mais
refinado, o mais subtil, servirá de consolo e de deleite, leio nos livros da
sabedoria. Mirabeau, um sábio, vive na saudade: aqueles tempos – recorda-se,
recorda-me – em que a gente era capaz de dar três e quatro sem tirar o pau de
dentro. Recordar aqueles tempos será esse o prazer de que se fala?
Jorge Amado em Navegaçãode Cabotagem
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