O meu pai sempre me foi dizendo que não devíamos emprestar livros, porque na maior parte das vezes não voltavam ao lugar da estante.
Mas também falava da cara com que não lhe apetecia dizer que não. Porque
alguns amigos ainda tinham menos posses que ele, não tinham quase dinheiro para
comprar comida quanto mais livros. Havia os que estavam nos calabouços salazaristas
da PIDE e necessitavam de livros para ajudarem os dias malditos.
Daí ter encontrado livros, com ficha feita, que não ocupavam as
prateleiras na Biblioteca da Casa, nem qualquer indicação a quem tinham sido
emprestados.
Emprestei livros, uns regressaram, outros não, mas agora o dilema já
não existe, porque sabe-se que 56% dos portugueses não leram um único livro
durante o passado ano.
No entanto aconteceu-me que, quando aqui falei na companhia que faziaao meu avô nos programas televisivos da Maria de Lurdes Modesto, necessitei de
consultar o «Livro de Bem Comer» do José Quitério.
Voltas e mais voltas e do livro nem sombras.
Claro que metade do meu cérebro já não funciona, mas emprestar o livro
do Quitério a quem?
Há dias, fui até à Rua Passos Manuel na expectativa de, na Assírio
& Alvim encontrar por lá algum exemplar. Está esgotado, mas a amável trabalhadora
da livraria, falou-me da existência de uma edição que reunia o «Livro de Bem
Comer» e «Histórias e Curiosidades Gastronómicas».
É este o livro, editado em Maio de 2015 e que já vai em 3ª edição.
Em «Nota Posfacial», José Quitério explica:
«Livro de Bem Comer foi publicado em 1987 e «Histórias e
Curiosidades Gastronómicas» em 1992.
Fizeram sem pressas os seus caminhos e acabaram naturalmente por esgotas.
Durante muito tempo não anuí à sugestão do editor para os reeditar. Com o
passar dos anos e o galopante aumento de interesse por estes temas, fui
admitindo tal possibilidade, sobretudo porque verifiquei que continuavam a ter
serventia, traduzida na muita gente que vinha beber destas águas, bastas vezes
sem citar a fonte. Relidos os textos, também cheguei à conclusão que talvez não
merecessem não ficar sepultados e poderem ser conhecidos pelos interessados da
nova geração.
É assim que, decorridos
respectivamente 28 e 23 anos, surge agora Bem Comer & Curiosidades». Não é uma mera junção dos dois. Foram
retirados todos os textos de cariz estritamente literário-gastronómico, que
entretanto enformara, acrescidos de vários outros, o livro Escritores à
Mesa (e outros artistas), de 2010.
Eliminaram-se alguns, adicionaram-se muitos mais, todos os originais foram
sujeitos a revisão, expurgo e amiúde a ampliação.
Aqui fica. Obra definitiva e
crê-se de registo histórico da cultura gastronómica portuguesa.»
De José Quitério disse José Cardoso Pires que «é um dos nossos prosadores vivos de mais inteligente qualidade»,
enquanto Mário de Carvalho afina pelo mesmo diapasão de Cardoso Pire,s mas
acrescenta «Porventura o maior».
Deliciava-me com as crónicas que durante largos anos: José Quitério
publicou no «Expresso».
A inteligência é sempre um prazer!
1 comentário:
Livro emprestado livro "roubado".
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