domingo, 22 de fevereiro de 2015

LUÍSA DACOSTA (1927-2015)


A escritora e docente Luísa Dacosta morreu aos 87 anos.

Fui sempre mais homenageada como professora do que como escritora.

Temos o triste condão de não partilhar os nossos melhores.

Sejam escritores, pintores, o que quer que seja, menos futebolistas e cantores-pimba.

Preferimos o supérfluo e o folclore medíocre e oco.

Gostava muito de ser professora e não conseguia imaginar a sua vida sem livros.

Militou na Oposição Democrática contra a ditadura.

Considerava o acordo ortográfico um crime.

São parvos, não sabem a língua.


Habituei-me a ler na Seara Nova as suas amáveis e poéticas crónicas.

Chamou-lhes A Ver-o-Mar.

Um título tão bonito como a escrita.

No seu Diário, falou das suas vivências em Timor.

Tínhamos, sem remorsos, abandonado um povo que durante séculos fora feitoria e colónia, primeiro a uma luta fraticida e partidária, depois a uma invasão.

Confessando:

Ia realmente percorrer os caminhos, as terras, as águas do mapa? Ia conviver com as gentes que sabia da enciclopédia e dos poetas?
Ali estava à procura dum destino, disposta a mar. A dar e a receber. Ah! esquecida de que a vida lhe recusara sempre destinos e que tudo o que tocava nas mãos, apodrecia, maleficamente, se esgarçava…

Palavras finais de Na Água do Tempo, escritas em Dezembro de 1987:

O tempo arrefece. Mas há sol e na linha do horizonte uns flocos de nuvens levemente rosadas como borlas de pó-de-arroz, 1920. Sobre as águas um jogo de velas. Os brancos fendidos oscilam, bailam sobre o azul – rodinha de borboletas, entre o leque aberto da rama dos pinheiros.
De manhã, dava logo de rosto com o mar, porquê então aquela melancolia? Olhava aquela beleza balética, oscilante, grácil, como se olhasse um campo lavrado de lágrimas. Era dela, dentro dela, que a melancolia morava.

Legenda: pormenor de uma crónica A Ver-o-Mar de Luísa Dacosta, publicada na Seara Nova nº  1461, Julho de 1967.

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