A Noite e o Riso
Nuno Bragança
Capa: Mendes de
Oliveira
Colecção:
Círculo de Prosa
Moraes Editores,
Lisboa s/d
Estive na Cidade e vi lá uma desagradável balbúrdia.
Eu estava no pátio em frente ao Tribunal; e estava a
beber água porque tinha muita sede. Nisto, gritos, patadas e pedidos de
socorro: tudo dentro de uma capelista. Quando vi um polícia magro a limpar o
cacete à aba do casaco percebi que o sarilho era curioso, porque o polícia era
magro (o que me pareceu muito curioso). Fui ver e tive custo em perceber o que
a capelista me explicou em lágrimas de raiva.
Parece que um homem que estava a comprar tabaco
zangou-se com a Justiça e declarou que se ia queixar ao Ministro. Mas também
estava ali um advogado, e disse ao homem que aquilo era asneira grossa.
«Porquê?», perguntou o homem.
«Por causa da Independência Jurisdicional», disse o
advogado.
«O que é que isso quer dizer?», perguntou o homem que
não era letrado.
«Quer dizer que ninguém manda nos Tribunais porque
eles mandam em si mesmos ou seja uns com os outros.»
A bofetada foi tão grande que meia hora depois o homem
se queixava da mão.
Custou-me um bocado não pregar um par de murros na
capelista.
Porque é que estes advogados não se contentam com
falar nos tribunais? E sobretudo não há direito que uma capelista se ponha aos
berros só por causa dum episódio corriqueiro.
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