A capa da Fanga
de Alves Redol, que se apresentou em Olhar as Capas não é, obviamente, a da
edição original da autoria de Fred Kradolfer, mas é a capa que existe na
Biblioteca da Casa.
Trata-se de uma
encadernação feita pelo meu avô paterno, com pano de retalhos de tecidos da Empresa
Fabril do Norte, na Senhora da Hora.
Tentarei
explicar:
O meu avô
paterno, Mário de seu nome, que, orgulhosamente, se dizia republicano
histórico, benfiquista e anticlerical, foi toda a sua vida caixeiro-de-praça do
J. Português das Silva, na Rua da Betesga, vendendo pelas lojas de Lisboa,
linhas e panos da Fábrica da Senhora da Hora.
Ganhava uma
miséria e todos os dias de segunda a sábado, transportava uma enorme mala com as
amostras.
Era um leitor
compulsivo.
Um dia, sem
qualquer tipo de aprendizagem, nenhum aviso à navegação, mostrou um livro encadernado por ele: a Fanga da Alves Redol.
O meu pai, quando
deu conta que a capa de Fred Kradolfer já não existia, disse-lhe que não se
podia fazer uma coisa daquelas.
Lembro-me então
de o ouvir dizer que a capa de um livro é uma coisa sagrada e essa ideia registei-a para sempre.
O meu avô ficou
sem palavras, pegou no livro e retirou-se, calmamente, com uma tristeza sem
fim.
Entendeu o
comentário, mas não mais encadernou livros.
O meu pai ainda
lhe disse que poderia encadernar livros não ocultando as capas, mas nada o fez
mudar de ideias.
Curiosamente, e
não lembro qualquer razão em especial – a capa colorida? Talvez! – foi este o primeiro livro que li de Alves
Redol.
Alves Redol fez questão de o dedicar aos fangueiros:
Para vocês, fangueiros dos campos da Golegã, escrevi
êste livro. Que algum dia o possam ler e rectificar – porque o romance da vossa
vida só vocês o saberão escrever.
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