José-Augusto França
tem 95 anos.
A idade que teria
José Saramago se ainda caminhasse por aqui.
Ambos nasceram no
mesmo dia, no mesmo ano, 16 de Novembro de 1922 , «ele às 14 horas (mas não muito viáveis numa declaração rural), eu às
14 e 35 minutos (declaração rigorosa de meu Pai contabilista), em sítios mais
ou menos vizinhos, ele numa aldeia cerca da Golegã, eu, como se sabe, nos
Estaus da cidade de Tomar.»
José Prudêncio,
professor de Filosofia, investigou as cartas astrológicas de ambos, teve
conversas com os dois intelectuais e escreveu sobre o assunto, um interessante
livro: Um Céu e Dois Caminhos.
Ontem, o Público noticiou a morte de José-Augusto
França.
Como Mark Twain,
Augusto França poderia dizer:
«Parece-me que as
notícias sobre a minha morte são manifestamente exageradas».
Todos temos a morte
anunciada mas é exigível que se morra pelo próprio pé e não empurrado, para a
dita cuja, pelo mau jornalismo.
A explicação da
Direcção editorial do matutino:
«O PÚBLICO falhou
no que não pode nunca falhar
A equipa do PÚBLICO tem um conjunto consistente de explicações para o
erro que nos levou a noticiar o falecimento de José-Augusto França. Tem o rasto
de uma informação que chegou à redacção e tem uma fonte credível e com rosto
(que nomeamos no momento em que corrigimos a primeira notícia) que a validou.
Mas essa explicação não passa disso mesmo: de uma explicação. Que não basta
para justificar a gravidade do nosso erro. As fontes que ouvimos, mesmo que
credíveis, não eram suficientes. E não tomámos a devida consciência que
notícias sensíveis como estas, que afectam gravemente a intimidade e os
direitos de pessoas concretas e das suas famílias, exigem cuidados redobrados.
O PÚBLICO errou e, manda a nossa forma transparente de estar, a
Direcção Editorial assume o erro por inteiro. Vai ser necessário rever
procedimentos para garantir que não haverá repetições.
Para lá destas necessárias explicações e do indispensável pedido de
desculpas aos leitores, resta-nos ainda uma palavra especial para José-Augusto
França e para a sua família. É dada aqui com este reconhecimento e será dada de
forma pessoal pela nossa equipa.»
A nota pontual de
Ferreira Fernandes publicada, hoje, no Diário
de Notícias:
«Um jornal, que não este, anunciou ontem a morte de José-Augusto
França. Logo, outros jornais portugueses, incluindo este, publicaram a citada
morte. Ora, José-Augusto França, de 95 anos, está vivo. O primeiro dos jornais
a publicar-lhe a morte será talvez o único a ter uma razão plausível para o
erro cometido - talvez um seu jornalista tenha recebido notícias que julgou
fidedignas. Talvez tenha sido vítima de uma brincadeira de mau gosto. Talvez,
não sei... Porém, todos os outros jornais, incluindo o DN, não têm desculpa nenhuma.
Desses, incluindo o DN, sabe-se, sem margem para dúvidas, porque
publicaram a falsa notícia: porque outro jornal já o fizera, os outros
apressaram-se a segui-lo. Apressaram o push - aviso para os telemóveis e
computadores dos leitores - pois um segundo de atraso diminuiria os cliques de
leitura. Um push é útil porque permite aos nossos leitores terem rapidamente o
alerta de uma notícia. Mas um push falso é uma arma letal: informa mal o leitor
e desvaloriza o nome do jornal.
E há, como neste caso, outra consequência mais grave: a falsa notícia
gratuitamente incomodou um homem, os seus familiares e os seus amigos. De
notícias de mortes apressadas está a história do jornalismo cheia, algumas
entraram na lenda e, com o passar do tempo, até fazem sorrir. Mas quando a
razão do erro bebe numa prática que destapa as fraquezas do jornalismo atual -
os seus meios limitados, as suas redações curtas e a pressão pelo imediatismo -
o melhor é tomar a sério a gravidade. O push é importante, mas mais importantes
são as pessoas.
E outra coisa: o push mandado por um jornal é um assunto editorial, de
jornalistas, que têm uma relação com a informação que vai para lá da eficácia.
O jornalista serve a verdade e só. Conselhos de técnicos da rapidez e de
aumento de tráfego são bons de ouvir porque devemos lidar bem com a tecnologia.
Tal como os jornalistas devem agradecer aos técnicos de ontem que lhes deram
teclados QWERT para escreverem as notícias. Mas tal como aos técnicos de ontem
não lhes era permitido insinuar que numa dada notícia se devia bater mais vezes
na letra Q do que na letra R, um jornalista de hoje não deve permitir outra
razão, além do jornalismo, que lhe apresse o push. Ponto.
Sem comentários:
Enviar um comentário