“There
is a house in New Orleans
They call the Rising Sun
And it’s been the ruin of many a poor boy
And God I know I’m one”
(“The
House of the Rising Sun”
- Versão Animals, 1964).
- Versão Animals, 1964).
Já desde os tempos do
velho John Ford que sabemos que quando a lenda suplanta os factos, publica-se a
lenda…
E a lenda diz que a
primeira gravação relevante do chamado Folk-Rock foi “Mr. Tambourine Man”, que
os Byrds de Roger McGuinn gravaram em Abril de 1965 e lançaram em Junho do
mesmo ano.
Mas “The House of the
Rising Sun”, na versão dos Animals de Eric Burdon, foi gravada em Maio de 1964
e lançada em Junho do mesmo ano, antecedendo, portanto, em cerca de um ano a
gravação dos Byrds. E há até quem garanta
que foi precisamente esta versão dos Animals que levou Bob Dylan a tomar a
decisão de ligar a sua música à corrente elétrica, o que acabaria por acontecer em estúdio com
as gravações de “Bringing It All Back Home” e, sobretudo, “Highway 61
Revisited”, e em público no Newport Folk Festival, na célebre noite de 25 de
Julho de 1965, para grande desespero do
Pete Seeger que terá procurado a todo o custo encontrar um machado para lhe
cortar os cabos elétricos da guitarra…
Porquê então este tão
flagrante lapso histórico…?
Por se entender que
Folk-Rock é uma coisa americana e os Animals serem ingleses…? Porque Roger McGuinn, proveniente do meio
Folk de Greenwich Village mas já fortemente influenciado pela música dos
Beatles, teorizou, de facto, acerca do Folk-Rock, e Eric Burdon não…? Inclino-me mais para o “efeito Bob Dylan” e
por “Mr. Tambourine Man”, na sua versão acústica, ter tido muito mais impacto no meio musical
americano daqueles tempos do que “The
House”, relativamente obscura na altura, “outside a small circle of friends” da
Folk mais tradicional…
Não foi para discutir
a genealogia da Folk-Rock que aqui venho hoje, mas a verdade é que isto é como
as cerejas…
Qualquer turista
saloio que goste um bocadinho de música e que passe por New Orleans vai querer
saber onde fica “The House of the Rising Sun”. E eu não fui exceção, claro
está…
Alguns, mais
crédulos, arriscam-se a comer o gato por lebre que qualquer guia turístico
local lhes queira impingir e até podem trazer para casa um “íman” de recordação
para colar no frigorifico...
Mas aqueles mais
precavidos que se lembrarem de fazer uma simples investigação prévia na Internet já sabem ao que vão e não têm quaisquer
ilusões...
É que é impossível,
nos dias de hoje, garantir onde ficava tal Casa.
Mesmo a origem da
Casa é motivo para grandes discussões. Um bordel…? Uma prisão…? Um hospital
para tratamento de doenças venéreas…? Um lar para acolhimento e “recuperação”
de meninas de má fama…?
Um livro já foi
dedicado ao assunto (Ted Anthony – Chasing the Rising Sun, The Journey of an
American Song - 2007), mas acabou por ser, ele próprio, inconclusivo quanto à origem e à
localização. É que durante os mais de
quatro séculos que se pensa que a canção tem, a sua letra sofreu constantes
alterações, cada uma delas lançando uma pista distinta.
A própria localização
da Casa em New Orleans pode ser duvidosa…. Segundo Ted Anthony, a canção terá a
sua origem numa balada inglesa do Séc. XVI que, como muitas outras, foi trazida
para a América através das primeiras vagas de colonos. A partir daí e por
intermédio daquilo a que se convencionou chamar o “Folk Process”, a letra foi
sendo alterada à medida que passava de região para região, e de geração para
geração. No início do Séc. passado a canção já era conhecida por “Rising Sun
Blues” e é possível que a escolha da cidade se fique a dever ao simples facto
de New Orleans ser, na altura, um enormíssimo antro de má fama, tal como, em
geral, toda a região do Delta do Mississipi.
Mas se não há “verdade histórica”, não faltam os palpites…
Um deles diz que no
atual nº 826-830 da St. Louis Street
(foto que encima o texto) existiu em meados do Séc. XIX um bordel gerido por
uma tal Madame Marianne DuSoleil Levant e que viria daí a origem do nome. Esta
teoria foi atrativa durante muito tempo e o então proprietário da casa chegou a
convidar Eric Burdon para ir lá passar uns dias, convite esse que foi
aceite. Burdon ajudou à festa, cantou
várias vezes a canção e afirmou que tinha sentido uma estranha comunicação
entre a casa e ele (“the house was talking to me…”, disse ele na altura)
Outro garante que a
casa na sua origem era realmente um bordel, mas que ficava no que
é hoje o Hotel Villa
Convento (fotos acima), no nº 616 de
Ursulines Avenue.
Outro ainda afirma
que a casa era o antigo Rising Sun Hotel, de inícios do Séc. XVIII,
que ficava no nº 535-37 da Conti Street (foto acima).
Escavações recentes teriam trazido à luz vestígios do que fora anteriormente um
bordel, pelo que o enigma estaria, finalmente, esclarecido…
Ainda
outro assegura que a casa era um Hospital que faria parte integrante do que é
hoje
o Old Ursuline
Convent, no nº 1100 de Chartres Street (fotos
acima).
Um outro afirma que a
Casa não seria mais do que a velha “Old Parish Prison”, que teria existido
entre 1834 e 1894 em Treme Street. Parece que no cimo de um dos portões de
ferro do edifício estava o desenho de um sol nascente, e daí…
E outros mais lugares
haveria a citar e a visitar mas, para mim, de brincadeira já bastava….
No meio de todo este
imbróglio, a única coisa que se pode garantir como verdadeira é que existe, de
facto, em New Orleans uma “The House of Rising Sun”: é um Bed & Breackfast
que fica do outro lado do rio que os proprietários nomearam em homenagem à
canção, mas sem qualquer pretensiosismo quanto à sua origem…
Mas deu-me imenso
gozo este périplo pelo French Quarter, à procura da casa do sol nascente…
Como gosto de
mistérios e de “filmes de época” a preto e branco, prefiro imaginar um fim de história ao estilo
dos velhos filmes góticos da Hollywood dos anos 40….
Neblina, muita
neblina vinda das bandas do rio invade uma casa antiga num beco esconso, pobremente
iluminado por um frágil candeeiro de rua… Um gato afasta-se, furtivamente…. E a
câmara começa a recuar muito lentamente
até que o enquadramento se torne cada vez mais pequeno e tudo acabe num fundido
a negro enquanto ao longe se começa a
ouvir, baixinho, o inconfundível acorde da guitarra elétrica de Hilton
Valentine, um dos mais emblemáticos de toda a história da Música Popular…
“There was a house in
New Orleans
They call the rising sun”….
Texto e fotos de Luís Miguel Mira.
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