«A minha Lisboa foi sempre uma Lisboa de bairros pobres, quando muito
remediados, e se as circunstâncias me levaram, mais tarde, a viver noutros
ambientes, a memória mais grata e mais ciosamente defendida foi sempre a de
Lisboa a da Lisboa dos meus primeiros anos, a Lisboa da gente de pouco ter e
pouco sentir, ainda rural nos costumes e na ideia que fazia do mundo»
José Saramago em Cadernos de Lanzarote, II Volume.
Razões existirão –
cada um com a sua! – para que os leitores, a crítica teça loas aos romances, e
outros livros, de Saramago e torça o nariz aos diários escritos em Lanzarote.
Este é o segundo
volume, publicado em Março de 1995 e referente ao ano de 1994.
Entrada escrita no
dia 28 de Fevereiro:
«Somos a memória que temos e a responsabilidade que assumimos. Sem
memória não existimos, sem responsabilidade talvez não mereçamos existir.»
A 1 de Dezembro
palavras sobre a morte De Fernando Lopes Graça:
«Morreu
o querido Graça, o amigo do coração, o camarada fidelíssimo e leal. Tudo isso
acabou. Sim, já sei, a recordação, a memória, a saudade, a lembrança. Essas
coisas duram, de facto, mas porque duram, cansam. Um dia destes a evocação de
Lopes-Graça só causará uma leve mágoa, que disfarçaremos contando uma das sua
mil vezes repetidas anedotas. Buscaremos então o Graça onde ele verdadeiramente
sempre esteve: nos seus livros, de uma linguagem puríssima que poderia servir
de lição a escritores, principiando por este; nos seus discos, mas também nas
salas de concerto, que não lhe abriram tanto quanto deveriam enquanto viveu. O
homem acabou, não podemos pedir-lhe mais nada, mas a obra aí ficou, à espera do
que sejamos capazes de pedir a nós próprios. O justo juízo vem sempre depois,
quase sempre tarde de mais. Talvez seja essa a causa do amargor de boca que
sinto ao terminar estas linhas.»
Legenda: capa de Cadernos de Lanzarote II Volume publicado
pela Porto Editora. A caligrafia da capa é da autoria de José Santa-Bárbara.
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