Durante os próximos
tempos, iremos apresentar, diariamente, uma capa das edições dos livros de José
Saramago que a Porto Editora tem vindo a colocar no mercado.
Todos os livros de
Saramago, nas velhas capas amarelas da Caminho já aqui foram apresentadas mas
pareceu-nos interessante registar estas novas capas.
As capas da Porto
Editora foram concebidas para que autores portugueses desenhassem, com a sua
letra, o título do respectivo livro.
Numa recente
entrevista, foi perguntado a Zeferino Coelho se tinha sido difícil lidar com a
mudança da obra de José Saramago para a Porto Editora
«Acho que não foi,
porque, de alguma maneira, eu já estava à espera que isso acontecesse. Não me
pergunte porquê, porque não sei bem, mas é uma coisa que, enquanto editor, está
sempre em cima da mesa. Faz parte do direito dos autores irem publicar onde
muito bem entenderem. E se os detentores atuais dos direitos da obra do
Saramago acharam que deviam ir para outra editora, muito bem.»
Recorde-se que José
Saramago, quando quis publicar «Levantado
do Chão», recorreu a várias editoras que entenderam que editá-lo, por
aqueles tempos, não seria aconselhável.
Zeferino Coelho
arriscou e sabe-se, hoje, que em boa hora o fez.
Em memória das «capas
amarelas» da Caminho voltamos a transcrever um texto que Ângela Caires publicou
num jornal - «Um Rapaz Chamado Saramago».
Saramago considerou-o «um dos textos mais divertidos em que
alguma vez pus os olhos» e transcreveu-o no 2º Volume dos «Cadernos de Lanzarote»:
«Costumo receber uns livros de capa amarela, habitados
por personagens de nomes esdrúxulos, que têm em comum o facto de serem
assinados por um rapaz chamado Saramago. Na dúvida se haveria de
sacrificar-lhes o meu tempo, face a um antigo volume que levantei do chão,
perguntei a um editor meu amigo se tal livro seria merecedor de atenção. Que
não, garantiu. Aduzindo argumento demolidor: a sua editora recusara-se a
publicá-lo. Com sobejas razões: o escrevente, que usa e abusa de vírgulas,
raramente sabe onde colocá-las. Pontos parágrafos, então, nem vê-los. Daria um
trabalho dos diabos transformar aquela massa informe de texto em prosa
escorreita. Por esta razão, lá foi o original parar a uma editora de
comunistas, onde, aliás, o sujeito se acoita, politicamente falando.
Os camaradas fizeram o primeiro frete, dando à estampa
um volume com o nome arrevesado de “Levantado do Chão” que, segundo creio,
passou completamente despercebido. Para não falar do flop total de outra
tentativa, “Memorial do Convento”, de que seguramente ninguém guarda memória.
Os editores, certos de que esta aventura lhes apontaria a falência, nem
investiram muito no produto: não gastaram uns tostões a ilustrar as capas,
produzindo-as em cartão liso de cor desmaiada.
O candidato a escritor poderia ter ficado por aqui.
Mas a prova de que o autor não tem o menor sentido de humildade é que
reincidiu. Raro é o ano em que não põe cá fora mais volumes de capa amarela,
sempre com títulos desenxabidos e enganadores.
Nunca mais me vi livre dele. Por um aniversário,
veio-me parar às mãos, camuflada em fitas e celofane, uma “Jangada de Pedra”,
que mais não era do que uma narrativa alucinada da experiência vivida por um
cão com pavores de tremores de terra. Num Natal couberam-me sete exemplares da
“História do Cerco de Lisboa”, que não é história de um cerco nem de Lisboa,
mas sim, de um revisor às voltas com uma esquisita sinalefa tida por deleatur.
Para não falar do dia em que ofereci a um sobrinho com pendor para as belas
artes um “Manual de Pintura e Caligrafia” que nada tinha a ver com pincéis nem
caneta. A última afronta, qualquer coisa como “O Evangelho Segundo Jesus
Cristo” é a prova concreta da sua total falha de recursos criativos. Nem
plagiar a Bíblia o sujeito sabe. E, mesmo depois dos conselhos do dr. Sousa
Lara (“homem vá para casa, leia, estude”), continua a escrever. Continua.
Continua.
Como ninguém lhe compra livros, acho que vêm todos
parar à minha estante, por via de amigos e familiares que adoram pregar-me
partidas – não sei por que é que a editora insiste em publicar as suas mal
arrumadas prosas, arruinando-se certamente. Coisas de comunistas.
Além do mais, como escritor, o homem é um perigo.
Imagine-se que os seus textos vão parar às escolas. Lá se vai o denodado
esforço de Couto dos Santos, de Roberto Carneiro, de Deus Pinheiro, e de outros
intrépidos ministros da Educação, para as criancinhas aprenderem o bom
português da dra. Edite Estrela.
Legenda: capa do
Catálogo que a Porto Editora, nos 20 anos da atribuição do Nobel, distribuiu na
Feira do Livro, que inclui todas as novas capas dos livros de Saramago bem como
os «Discursos de Estocolmo».
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