Há uma semana, Urbano Tavares Rodrigues deixou-nos.
É norma dizer-se que parte o homem mas fica a obra.
Sim, a variada obra de Urbano está aí, uma obra que
nos anos 50/60, no dizer de Mário Cláudio, foi uma lufada de ar fresco na
literatura portuguesa, mas fica a faltar-nos o homem. Esse homem afável e
tolerante, a sua delicadeza, a sua integridade, aquela voz pausada, um homem
que viu a ditadura de Salazar/Caetano privá-lo do que mais gostava de fazer na vida: ser
professor.
Ainda Mário Cláudio: alguém de quem se dizia bem em vida – o que não é habitual entre nós –,
não só como escritor mas também no plano cívico. Nunca usou o seu
posicionamento político, que era bem conhecido, para fazer qualquer espécie de
segregacionismo. Há melhor? Não há. Parecido? Também não. Quase não se acredita
que fosse português. Mas era. Por isso, nem toda a esperança está perdida.
É isto que nos fica a faltar, algo mais.
Em
Outubro do ano passado, numa entrevista ao Ipsilon,
suplemento do Públio, dizia que o sentido da sua vida era um misto de
tolerância, de compreensão e respeito pelos outros. Um homem sem ódios mas, com algumas excepções.
Posso
sentir ódio contra aqueles que vivem de explorar os outros... mas eu tenho sido
mais vítima de ódio. Ainda não tive o prémio Camões porque soube recentemente
que há membros do júri que dizem: "esse comunista não terá o Prémio
Camões.
A
jornalista pergunta-lhe se sente mágoa por não ter ganho o Prémio Camões.
Tenho
revolta. Mereço amplamente o Prémio Camões. Não é pelas honrarias, que já tive
muitas. Até em França já me deram a Legião de Honra, mas isto é asqueroso.
Já
deixara o mesmo desabafo numa entrevista ao Manuel Rodrigues da Silva.
José Saramago, em Fevereiro de 2003, escrevia-lhe dizendo que com atraso também te há-de ser
entregue o “Camões”.
Não aconteceu.
O editor Manuel Alberto Valente foi claro:
Julgo que Portugal não lhe prestou a merecida
homenagem em vida e espero que agora se lembre de lha prestar. Enquanto isso,
espero que as pessoas o possam homenagear lendo os seus livros.
Até
ao final do ano, a Dom Quixote que, desde 2007 tem vindo a publicar toda a obra
de Urbano Tavares Rodrigues, colocará nos escaparates o seu último livro: Nenhuma
Vida, um curto romance com um prefácio, escrito pelo próprio Urbano, em
que se sente já a sua despedida do mundo, de todos nós.
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