3-3-63
Na visita de hoje tive ocasião de referir à k. aquilo
que considero uma bela conquista semântica para o português falado de Luanda: o
verbo amigar que qto. a mim exprime bem um amor total, aquele em que ambos se
reconhecem amigos e amigam, i.e. fazem do seu amor uma amizade para todos os
amores e seres do mundo. Claro que ao verbo se dá um valor depreciativo,
baseado no conceito de que quem não casa pela igreja não casa verdadeiramente:
ponto de vista da burguesia agarrada à tradição da igreja, em que a mulher
aparece no casamento como objecto que, mercê daquelas palavras latinas, fica
inteiramente e para sempre dependente do homem. Mas o termo está criado e ele
ultrapassa em beleza e significado tudo quanto lhe quiserem amarrar e limitar.
É uma bela palavra para definir uma decisão: a de 2 pessoas que se amam e
aceitam só na base desse amor, construir a sua vida comum (tenho que ir
empregando este verbo, reabilitá-lo, tirá-lo da porcaria burguesa onde o metem
e elevá-lo à palavra definidora do amor total).
José Luandino
Vieira em Papéis da Prisão
Legenda: não foi
possível identificar o autor/origem da fotografia.
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