Final da carta
de Jorge de Sena para Eugénio de Andrade datada de 2 de Novembro de 1958:
P.S. – Sabe V. que o meu soneto à memória do papa me
valeu uma carta anónima do Porto, classificando-o de… não poesia mas desinteria?
Palavra que, para meu governo, gostaria de saber quem foi, pois não terá sido
um simples leitor qualquer, Investigue-me isso.
Por carta,
datada de 10 de Novembro, Eugénio de Andrade responde a Sena:
Que coisa horrorosa essa história da carta anónima!
Não poderei averiguar nada sobre isso – há já muito, muito tempo, que me
afastei de qualquer convívio de todos os «literatos» capazes de tais infâmias!
E aqui há bastantes!
É este o soneto
de Jorge de Sena:
Como de Vós
À memória do papa Pio XII que quis, ouvir,
moribundo, o «Alegret-
To da Sétima Sinfonia de
Beethoven
Como de Vós, meu Deus, me fio em tudo,
mesmo no mal que consentis que eu faça,
por ser-Vos indiferente, ou não ser mal,
ou ser convosco um bem que eu não conheço,
importa pouco ou nada que em Vós creia,
que Vos invente ou não a fé que eu tenha,
que a própria fé não prove que existis,
ou que existir não seja a Vossa essência.
Não de existir sois feito, e também não
de ser pensado por quem só confia
em quem lhe fale, em quem o escute ou veja.
Humildemente sei que em Vós confio,
e mesmo isto o sei pouco ou quase esqueço,
pois que de Vós, meu Deus, me fio em tudo
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