O Sinal Admirável
Sobre o significado e valor do Presépio
Papa Francisco
Introdução: Rino Fisichella
Capa: Departamento gráfico Paulinas
Foto da capa: A Adoração dos Pastores
de Bartolomeu Esteban
Murillo
Murillo
Paulinas Editora, Lisboa, Dezembro 2019
Gostava agora de repassar
os vários sinais do Presépio para aprendermos o significado que encerram. Em
primeiro lugar, representamos o céu estrelado, na escuridão e no silêncio da
noite. Fazemo-lo não apenas para ser fiéis às narrações do Evangelho, mas
também pelo significado que possui. Pensemos nas vezes sem conta que a noite
envolve a nossa vida. Pois bem, mesmo em tais momentos, Deus não nos deixa
sozinhos, mas faz-se presente para dar resposta às questões decisivas sobre o
sentido da nossa existência: Quem sou eu? Donde venho? Porque nasci neste
tempo? Porque amo? Porque sofro? Porque hei de morrer? Foi para dar uma
resposta a estas questões que Deus se fez homem. A sua proximidade traz luz
onde há escuridão, e ilumina a quantos atravessam as trevas do sofrimento (cf.
Lc 1,79).
Merecem também uma
referência as paisagens que fazem parte do Presépio; muitas vezes aparecem
representadas as ruínas de casas e palácios antigos que, nalguns casos,
substituem a gruta de Belém tornando-se a habitação da Sagrada Família. Parece
que estas ruínas se inspiram na Legenda
Aurea, do dominicano Jacopo de Varazze (século XIII), onde se refere a
crença pagã segundo a qual o Templo da Paz, em Roma, iria desabar quando desse
à luz uma Virgem. Aquelas ruínas são sinal visível sobretudo da humanidade
decaída, de tudo aquilo que cai em ruína, que se corrompe e definha. Este
cenário diz que Jesus é a novidade no meio dum mundo velho, e veio para curar e
reconstruir, para reconduzir a nossa vida e o mundo ao seu esplendor
originário.
Uma grande emoção se
deveria apoderar de nós, ao colocarmos no Presépio as montanhas, os riachos, as
ovelhas e os pastores! Pois assim lembramos, como preanunciaram os profetas,
que toda a criação participa na festa da vinda do Messias. Os anjos e a
estrela-cometa são o sinal de que também nós somos chamados a pôr-nos a caminho
para ir até à gruta adorar o Senhor.
«Vamos a Belém ver o que
aconteceu e que o Senhor nos deu a conhecer» (Lc 2, 15): assim falam os
pastores, depois do anúncio que os anjos lhes fizeram. É um ensinamento muito
belo, que nos é dado na simplicidade da descrição. Ao contrário de tanta gente
ocupada a fazer muitas outras coisas, os pastores tornam-se as primeiras
testemunhas do essencial, isto é, da salvação que nos é oferecida. São os mais
humildes e os mais pobres que sabem acolher o acontecimento da Encarnação. A
Deus, que vem ao nosso encontro no Menino Jesus, os pastores respondem,
pondo-se a caminho rumo a Ele, para um encontro de amor e de grata admiração. É
precisamente este encontro entre Deus e os seus filhos, graças a Jesus, que dá
vida à nossa religião e constitui a sua beleza singular, que transparece de
modo particular no Presépio.
Nos nossos Presépios,
costumamos colocar muitas figuras simbólicas. Em primeiro lugar, as de mendigos
e pessoas que não conhecem outra abundância a não ser a do coração. Também
estas figuras estão próximas do Menino Jesus de pleno direito, sem que ninguém
possa expulsá-las ou afastá-las dum berço de tal modo improvisado que os
pobres, ao seu redor, não destoam absolutamente. Antes, os pobres são os
privilegiados deste mistério e, muitas vezes, aqueles que melhor conseguem
reconhecer a presença de Deus no meio de nós.
No Presépio, os pobres e
os simples lembram-nos que Deus Se faz homem para aqueles que mais sentem a
necessidade do seu amor e pedem a sua proximidade. Jesus, «manso e humilde de
coração» (Mt 11, 29), nasceu pobre, levou uma vida simples, para nos
ensinar a identificar e a viver do essencial. Do Presépio surge, clara, a
mensagem de que não podemos deixar-nos iludir pela riqueza e por tantas
propostas efémeras de felicidade. Como pano de fundo, aparece o palácio de
Herodes, fechado, surdo ao jubiloso anúncio. Nascendo no Presépio, o próprio
Deus dá início à única verdadeira revolução que dá esperança e dignidade aos
deserdados, aos marginalizados: a revolução do amor, a revolução da ternura. Do
Presépio, com meiga força, Jesus proclama o apelo à partilha com os últimos
como estrada para um mundo mais humano e fraterno, onde ninguém seja excluído e
marginalizado.
Muitas vezes, as crianças
(mas os adultos também!) gostam de acrescentar, no Presépio, outras figuras que
parecem não ter qualquer relação com as narrações do Evangelho. Contudo esta
imaginação pretende expressar que, neste mundo novo inaugurado por Jesus, há
espaço para tudo o que é humano e para toda a criatura. Do pastor ao ferreiro,
do padeiro aos músicos, das mulheres com a bilha de água ao ombro às crianças
que brincam… tudo isso representa a santidade do dia a dia, a alegria de
realizar de modo extraordinário as coisas de todos os dias, quando Jesus
partilha connosco a sua vida divina.
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