segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

OLHAR AS CAPAS


Diário

IV Volume
Miguel Torga
Edição do Autor, Coimbra Abril 1949

S. Martinho de Anta, Natal – Uma consoada triste, com minha Mãe a apodrecer no cemitério. À chegada, já não estava ela à porta a esperar-nos, nem ao jantar as rabanadas tinham o mesmo gosto. O velho, coitado, foi até onde pôde para se mostrar mais humanizado, Recebeu-nos ele, e fez as honras da casa. Como era impossível delegar na companheira perdida as delicadezas e os sorrisos, a sua timidez esforçou-se e apresentou-se gentil e afectuosa.
É fácil, porém, descobrir nos seus modos e nas suas palavras um desprendimento do mundo que não terá remédio. É como se ele tivesse também morrido já, mas estivesse condenado a fingir de vivo mais algum tempo.

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