As
palavras afastam. E porquê? Parole, parole,
words, words, words. Palavras.
Vivemos ensopados até aos ossos de palavras, explicavam as sombras silenciosas
do convento de Muros. Palavras sábias, palavras-truque, palavras-chave.
Palavras consensuais. Palavras-surpresa. Palavras oportunas. Palavras urgentes
usadas por cada um com mais ou menos eficácia.
Em
Muros, no antiquíssimo e modesto convento franciscano, com as suas hortas tão
poeticamente organizadas no meio de uma floresta. Com uma via-sacra que leva ao
cimo da montanha e um caminho de árvores seculares que conduz à praia,
pareceu-me estarmos ainda mais afastados de nós mesmos e içados pelas palavras
a um lugar tão alto que a realidade das coisas se torna vertiginosa. Se entre
nós e as palavras há «metal Fundente»,
como tão bem diz o definitivo poema de Cesariny, «You are Wellcome to
Elsinore», entre as coisas e as palavras jamais saberemos o que se intrometeu,
para além de uma espécie de óleo cada vez mais industrial e mutável, que as
articula ao seu nome. Como escreveu Ramón Gomez de la Serna, «os rios não
conhecem os seus nomes». Pascoaes vai mais alto: «Deus não sabe como se chama.»
E, quanto à literatura, escreveu o poeta de Regresso ao Paraíso: «A literatura
é anti-divina e anti-satânica, um produto industrial.» No inebriante silêncio
de Muros ia pensando que, mais do que evidenciadas preocupações com o próximo
milénio, melhor seria invertermos o sentido da análise, regressando pacientemente,
pelo caminho estreito, ao sabor primeiro do verbo baptismal
E a Galiza e
a sua Costa da Morte que leva à finisterra seria uma bela paisagem para começar
uma qualquer nova língua. E que Pascoaes diga que «no planeta há montes,
campinas, rios, lagos, etc., mas não há qualquer paisagem». Eu digo que há: a
Galiza.
Legenda: Costa da Morte, óleo de Rubén de Luis
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