Durante muitos anos, os países – sobretudo os que tinham
vivido ditaduras e uma situação de analfabetismo prolongada – queixavam-se de
que as pessoas liam pouco (ou, pelo menos, que poucas pessoas liam). Agora, é
mais comum ouvir-se dizer que há muito mais gente a ler, mas que a maioria lê
«mal», não necessariamente por não dominar a capacidade de leitura, mas por
escolher maus livros, que em nada contribuem para o crescimento intelectual e a
formação do indivíduo. Faço aqui um mea culpa em nome da
classe e digo que os editores (sobretudo aqueles que não cumpriam ordens e
podiam fazer de outro modo) tiveram aqui uma grande responsabilidade, pois, em
lugar de publicarem obras que pudessem fazer dos leitores gente mais informada
e culta, deram-lhes papa de entretenimento feita com ingredientes de segunda e
assinada por gente analfabeta com carinhas larocas e conhecidas, aspirando,
mais do que tudo, às receitas e ao lucro. Sinto que cada vez mais é assim – que
isto se tornou um vício – e que todos os anos a literatura perde vendas para as
chachadas ditas comerciais. O mesmo em todo o mundo, sublinhe-se, tendo eu
sabido recentemente que o grande editor alemão Michael Krüger, no activo desde
1968, decidiu retirar-se e ir para casa, alegando que já não faz falta, pois as
pessoas gostam sobretudo de livros maus. O editor é uma espécie ameaçada.
Maria do Rosário Pedreira em Horas Extraordinárias
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