terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

O SENHOR COLUNA (1935-2914)


Era assim que Eusébio – e não só! - tratava Mário Esteves Coluna que hoje, em Maputo, morreu aos 78 anos.

Era o respeito e a ternura por um grande senhor do futebol, respeito partilhado por todos os que foram seus companheiros de equipa, ou que com ele conviveram.

O grande capitão, ou o monstro sagrado, colocado, pelas respectivas instâncias, no leque dos 100 melhores jogadores mundiais do Século XX.

Quando Coluna chegou ao Benfica, tinha eu 9 anos e desde os 6 que via futebol.

Estou agora sentado nas bancadas de pedra do velho Estádio da Luz, ao lado do meu avô que se protegia do sol com um chapéu feito de folhas de jornal.

Não lembro agora se assisti à estreia de Coluna, mas acompanhei toda a sua carreira, vi o suficiente para dizer que quando colocou no braço a braçadeira de capitão, que lhe deixou um outro grande capitão e brilhante jogador que se chamava José Águas, aqueles rapazes passaram a ter um ser solidário e humano e que os ajudou a voarem mais alto. Homem de poucas falas, sereno, nunca necessitou de gritos para impor respeito e disciplina.

Bastava um simples olhar.

Lembro-me do meu pai dizer que era nos jogos que o Benfica fazia fora da Luz fora da Luz, que o seu gigantesco trabalho de sapa, de luta mais sobressaía.

O Benfica daqueles tempos foi o que a história regista, montra de grandes jogadores, que se tornaram ainda maiores por ao lado terem aquela figura incontornável de homem sabedor e solidário.

No banco estava um treinador mas dentro do campo havia aquele maestro.

O que fazia toda a diferença.

Já não há jogadores assim, aliás no futebol já nada é como no tempo em que me sentava, com o meu avô, nas bancadas de pedra do Estádio da Luz.

Saudades…

Passados todos estes tempos, e para se perceber o quanto Coluna era importante na manobra da equipa, mantenho uma certeza: o Benfica não ganhou a terceira Taça dos Campeões Europeus, contra o Milan, Wembley, 25 de Maio de 1963, uma bonita tarde de sol, televisão a preto e branco, porque, propositadamente ou não, quando o Benfica ganhava por um a zero, inevitável golo de Eusébio, os italianos, nos primeiros minutos da 2ª parte, lesionaram gravemente Mário Coluna.

Porque para além do inesquecível ferrolho, os italianos tinham por lá uma rapaziada que faziam do pontapé e da canelada a sua matriz de jogo. Cirandava na equipa Trapattoni que, muitos anos depois, como treinador, seria campeão no Benfica.

Não havia substituições, Coluna esteve longo tempo a ser assistido e só regressou, muito debilitado, a escassos minutos do fim do jogo. Já o Milão tinha batido por duas vezes o Costa Pereira, dois golos da autoria de um tal Altafini, brasileiro naturalizado italiano.

Terminada a carreira, quando aconteceu o 25 de Abril, Mário Coluna respondeu ao aceno que Samora Machel lhe endereçou para voltar a Moçambique, terra natal, onde desempenhou funções governativas e desportivas.
Aos poucos vão desaparecendo os nomes grandes da minha juventude, as minhas referências.

Os escritores e os cantores encontro-lhes as obras nas estantes mas para aquelas maravilhosas jogadas, aqueles gritos de golo na garganta… apenas a memória.

Fazer o resto do caminho em silêncio, um exercício sempre solitário e repleto de tristeza.

Em meia dúzia de dias Eusébio e Coluna deixaram-nos.


Que horrível começo de ano!

Legenda: Mário Coluna passeado em ombros na sua Festa de Despedida, 8 de Dezembro de 1970.
Fotografia tirada de  100 Anos de Lenda, Diário de Notícias Lisboa, Dezembro de 2004

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