Agora sou a criatura que prepara as asas para o
voo
sou o chefe da estação que se
esqueceu de apitar
sou a beata que falhou
na missa
aparentemente o barro solto
num jardim
perdido perdido
na imensidade das mãos
das curvas e
dos sons das névoas que elas traçam
Sim hoje amor a tarde ou a manhã de nunca
hoje as balas o sangue a confusão
decisivas horas que se
arrastam sem cor
e cerram janelas pombas
de luto vermelho
Agora a partida com aviões silenciosos
aéreos e possíveis os desejos
a dança a enxada
o campo juncado
de berros oceânicos
as trevas a noite grandes infindáveis
e na sombra das casas
a luz brilha
e a esperança nasce
no grito do miúdo da quinta geração de estátuas
nas asas do primeiro anti-porteiro
Agora hoje choro sinto
o canto sobe
e há arestas quebradas
montras sem vidros
e bolos agora há bolos pão
e fome saciada
sou como um café
de muitos agrupados muitos de comboio e sempre direitos
Na metamorfose fatal o grito assoma
a criança rompe
a dieta o leito
e pela primeira vez
é um chefe de estação esquecido
uma beata revoltada
Joaquim Benite
Nota do Editor: este poema de Joaquim Benite, logo após a sua morte, foi publicado por
Nicolau Santos no Expresso.
Sobre o poema ver o blogue As Palavras são Armas.
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