quarta-feira, 9 de julho de 2014

OS IDOS DE JULHO DE 1974


 1 a 7 de Julho

O DIÁRIO POPULAR  publica um documento, assinado pelo ex-director da PIDE/DGD, major Silva Pais, em que, pelo menos três agentes devem assistir às missas de domingo, principalmente nas igrejas em que alguns padres, em acto de culto, atacam declaradamente as instituições e a política ultramarina do governo e os seus princípios morais.
Sempre que possível as homilias devem ser gravadas.
O que não se pode é assistir passivamente com simples protestos verbais, à acção dissolvente e subversiva conduzida por esses sacerdotes.

A CHINA não reconhecerá o governo português enquanto não for dada independência às colónias de África.

PARTE FINAL da coluna Feira das Vaidades de Artur Portela Filho, publicada no República de 1 de Julho:
O 25 de Abril é História.
Estes dois meses ainda não são.
Ou, se quisermos, já não são.
Porque, não contestando, ainda, ninguém a António de Spínola, a qualidade, a generosidade, a largueza, há o receio de que este homem esteja hesitando entre se o 25 de Abril é um golpe de Estado ou se é uma revolução.
O dilema é este: o 25 de Abril recusa a sua dinâmica ou não recusa.
Se recusa, no temor do temor, e procura substituir um carisma por outro carisma, aí temos a revolução bloqueada.
Se não recusa, no destemor da coerência, e procura substituir o carisma por uma lucidez, e por uma solidariedade, aí temos a revolução em marcha.
António de Spínola é extremamente importante. Há é que decidir se o 25 de Abril é mais ou menos importante do que António de Spínola.
Resta-lhe escolher um dos dois lugares que a História lhe submete – o homem que desacelerou o 25 de Abril, o homem que levou por diante o 25 de Abril.
O primeiro lugar vale um parágrafo.
O segundo vale um capítulo.
Só por isto – porque, no primeiro lugar, entra um homem, e, no segundo, entram nove milhões de homens.

CERCA de uma centena de assinaturas de trabalhadores de teatro subscreveram um texto dirigido aos ministérios do Trabalho, da Educação e da Cultura pedindo um rigoroso inquérito à acção do empresário Vasco Morgado.

A CAPITAL E O REPÚBLICA foram os primeiros jornais a sofrer sanções impostas pela Comissão «ad hoc» para a Imprensa, Rádio, TV e Cinema, tendo sido multados respectivamente, em cem e trinta contos. Os trabalhadores do República resolveram  que a multa fosse paga por eles próprios, demonstrando assim a sua discordância com a penalidade que foi imposta ao jornal.

DOCUMENTOS REVELADOS pela revista Afrique-Asie vêm provar que a UNITA colaborou com o antigo regime português para destruir o MPLA e a FNLA.

FOI ENTREGUE AO Presidente da República, por uma comissão do movimento nacional pró-divórcio, uma lista com as primeiras assinaturas de cidadãos portugueses que pretendem a imediata revogação da lei que inibe os casados canonicamente de se divorciarem.

FOI ARQUIVADO o processo da Capela do Rato.

O CRONISTA Wilf Nassey que passou duas semanas em Portugal cita divergências crescentes entre a Junta, essencialmente conservadora e a esquerda. Os conservadores em Portugal deparam com grandes dificuldades, escreve Nassey, em se organizarem para fazerem frente aos comunistas pois tudo quanto se faz à direita do centro é imediatamente anunciado como uma ressurgência do fascismo expulso pelo golpe de estado do 25 de Abril.

FOI APROVADA em Conselho de Ministros a indicação do prof. Veiga Simão, ex-ministro da Educação da ditadura, para embaixador extraordinário plenipotenciário como representante permanente de Portugal junto da Organização das Nações Unidas.
Artur Portela Filho:
A nomeação do prof. Veiga Simão como embaixador de Portugal junto das Nações Unidas não fez pestanejar os blasés da política.
Registaram-se, no entanto,pelo menos, duas perplexidades.
A de Portugal.
A das nações Unidas.
E isto porque, tendo sucedido neste país, há dois meses e meio, uma revolução, tendo este País passado da Ditadura à Democracia, é inquietante saber que a revolução não achou melhor representante do país do que um membro do Governo contra o qual se fez a revolução.
É que, de duas, uma  ou um membro do Governo contra o qual se fez a revolução é, nitidamente, o melhor representante do país, e então a revolução está em causa, ou um membro do governo contra o qual se fez a revolução não é, definitivamente, o melhor representante do País, e então o que está em causa é esta nomeação.
Se é, porquê a revolução?
Se não é, porquê a nomeação?

Legenda: O recorte do  Diário Popular é de 4 de Julho e o de A Capital é  4 de Julho.

Fontes: Recortes de acervo pessoal, Diário de Uma Revolução, Mil Dias Editora, Lisboa, Janeiro de 1978, Portugal Depois de Abril de Avelino Rodrigues, Cesário Borga, Mário Cardoso, Edição dos Autores, Lisboa, Maio de 1976, Portugal Hoje, edição da Secretaria de Estado da Informação e Turismo,
A Funda, Artur Portela Filho, Editora Arcádia, Lisboa

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