terça-feira, 14 de novembro de 2017

OLHAR AS CAPAS


A Luz de Newton

Hélia Correia
Ilustrações: Alice Aurélio
Relógio d’ «Água, Lisboa s/d

Era uma vez um homem que nascera para sábio. Ora, às vezes, tal facto aborrecia-o muito. Sempre com o nariz enfiado em livros velhos, sempre a escrevinhar relatórios para enviara aos outros sábios que moravam longe – naquele tempo não havia telefone -, sempre a pensar e a repensar, a fazer contas, a espreitar para os céus e para os caldeirões, que coisa! Então não tinha direito a descansar?
Parou e foi abrir uma janela. O sol – se bem que fosse um sol inglês estava cheio de força naquele dia – entrou por ali dentro, todo entusiasmado, porque era muito raro o permitirem-lhe fazer uma visita àquele laboratório. Com a pressa, tropeçou contra um prisma de vidro e desfez-se nas suas sete cores. Surgiu um arco-íris na parede.
O sábio percebeu tudo o que se passara e ficou ainda mais aborrecido.
- Pronto! Agora estraguei o mistério que havia no Arco-Íris do céu! Não passa de um espectro da luz solar que se refracta nas gotinhas de água. Acabaram-se as histórias sobre as panelas de ouro escondidas no lugar em que ele toca na terra. Ninguém mais terá nele a túnica de Íris, mensageira dos deuses, nem o sinal da paz entre Jeová e os homens. Mas que grande chatice!
Para desanuviar, foi dar um passeiozinho. Mas, como estava pouco habituado a andar, depressa se cansou. Sentou-se à sombra de uma macieira. E vai, caiu-lhe um fruto em cima da cabeça. Estava a saboreá-lo com delícia quando gritou de novo:
- Que chatice!
Descobrira, ali mesmo, as leis da gravidade.

Sem comentários: