quinta-feira, 23 de novembro de 2017

PORTUGAL NÃO PRECISA DE SER SALVO


Só a 20 de Dezembro de 1962 Jorge de Sena consegue responder às cartas que Sophia lhe foi enviando. E explica-se:

Perdoe-me, se pode o meu silêncio. Mas eu não sei que fazer para aguentar o trabalho incrível que é cada vez mais vai sendo o meu. Todos os dias penso nas cartas que preciso de escrever àqueles que estão presentes no meu coração; e todos os dias sucumbo ao peso das urgências atropeladas de tudo o que tenho aceitado fazer. Se, nestes últimos meses, eu não estivesse livre da Direcção do Curso de Letras de que me demiti, não sei como estaria vivo…
(…)
Não foi, pois, por desinteresse que tenho estado calado, mas por humana impossibilidade. Espero que esta carta lhe chegue às mãos e se lhe demore nelas. Nunca imaginei que a PIDE se tentasse com os meus autógrafos…. Resta-me a consolação de pensarmos que ficaram sabendo o que já sabiam ou o que até bom seria que soubessem. A minha posição política continua inalterável: não tenho, e não terei nunca (a menos que me filie em mim mesmo), filiação partidária. Penso que a unidade de todos é a suma necessidade; mas reconheço que é impossível colaborar com a mediocridade invejosa, que é a dos nossos políticos, desde a clandestinidade em que mesmo no exílio se comprazem os comunistas, até ao Palácio de São Bento. Cada vez mais penso que Portugal não precisa de ser salvo. Porque estará sempre perdido como merece. Nós todos é que precisamos que nos salvem dele. Mas sabe que não há maneira fácil?

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