terça-feira, 9 de janeiro de 2024

REVISÃO DE NOTÍCIAS LIDAS


 

Os jornais lêem-se.

Por vezes calmamente, outras vezes na viagem do Metro, outras ainda à mesa do café.

Deles guarda-se uma ou outra página para leitura mais vagarosa, mais atenta, num outro qualquer dia.

Serão as notícias relidas.


No dia 14 de Dezembro de 2023, na sua crónica das quintas-feiras no Público, Nuno Pacheco, lembrou a morte, no ano que há pouco terminou, de José Duarte, o Jazzé como ele gostava que o chamassem.

Durante muitos anos fui ouvindo dizer que o jazz em Portugal se registava como: Antes e Depois de Vilas Boas.

Agora, também se acrescentará: Antes e Depois de José Duarte.

Antes e depois de muita gente que, em Portugal, tem dedicado ao jazz um amor sem fim.

 Nuno Pacheco:

 «O jazz está a acabar? Vai morrer? Vai ceder em definitivo a outros géneros musicais e perder os seus traços distintivos?

Passando ao lado desta discussão, não deixa de ser curioso que um homem que lhe dedicou a vida, diluindo-o no seu ego até o absorver no nome, passando de José Duarte a Jazzé Duarte (como gostava de se apresentar e ser conhecido), mantivesse durante décadas uma posição pessimista acerca do futuro do jazz, em particular do seu futuro em Portugal. Numa das últimas mensagens que me enviou, por correio electrónico, datada de Outubro de 2022, escrevia que andava por cá “até ao fim a lutar por jazz causa perdida”. E despedia-se, como sempre, com um “até jazz”. Morreu passados cinco meses, em Março de 2023, mas, muito antes dessa data, aquilo a que ele chamava “causa perdida” parecia, pelo contrário, uma causa ganha, a julgar pelo número (e qualidade) de novos músicos, pela quantidade de escolas, pela proliferação de festivais de jazz e de iniciativas a ele ligadas.»

Para completar os amores de José Duarte pelo Jazz, Nuno Pacheco cita um livro editado pela Guerra & Paz.

A saber:

«Chama-se Histórias de Jazz (ed. Guerra & Paz) mas podia chamar-se Histórias com Jazz, já que em todas elas o jazz está presente, das mais variadas formas (discos, cassetes, instrumentos, evocações fantasmagóricas), mesmo na que evoca Frank Zappa, músico de rock cuja ligação ao jazz se fez por via de influências e colaborações.

O livro, em si, tem uma história curiosa. Leonel R. Santos, que desde 2006 mantém activo o site JazzLogical.net, com informações regulares acerca do que se vai fazendo na área do jazz, dirigiu em 2001 uma revista de que foi co-fundador, a All Jazz. Um dia, conta ele na introdução, apareceu na redacção um leitor com duas histórias para eventual publicação. Interessou-se por uma delas (Jitterbug Waltz), publicou-a, e desafiou leitores e amigos a escreverem outras. Recebeu várias, em forma quase final ou em esquissos, mas, como a revista acabou, ficaram num limbo. Até que, passado anos, voltou a lê-las, reescreveu-as e fez este livro onde inclui 13 histórias, duas de sua inteira autoria e as restantes fruto das adaptações ou reescritas a que livremente se entregou (os autores dos originais são mencionados na introdução).

Assim, por entre ingredientes a que o jazz não é alheio (“amores desesperados, amizade, sexo, sangue, suor e lágrimas, traição, humor e fantástico”), somos conduzidos no desfecho de cada história a audições que lhes servem de banda sonora: de Frank Morgan (A lovesome thing) a Anthony Braxton (Opus 58), passando por Miles Davis (Sketches of Spain), John Coltrane (Every time we say goodbye), Jimmy Smith (Hackensack), Hank Mobley (Smokin’) e tantos outros. Ou ainda Charles Lloyd com Billy Higgins, no disco que gravaram em duo (só saxofone e bateria), Which way is East, com a particularidade de serem ambos chamados a protagonizar uma das histórias, Higgins, onde Charles chora no saxofone a morte de Billy, “porque um pedaço dele tinha morrido com o amigo”. Um livro de histórias para “ouler” com curiosidade, parafraseando o “ouver” de Jazzé.»

Termino recontando uma história já por aqui citada:

 Numa entrevista ao Expresso (06.02.2016), por ocasião dos 50 anos dos Cinco Minutos de Jazz, perguntaram-lhe por um episódio destes longuíssimos minutos de jazz, o José Duarte respondeu:

«Fui a uma rádio em Los Angeles, que passa jazz 24 horas por dia. O edifício era lindo, alto, todo em vidro. Era o início dos anos 70, o João ainda era vivo. Eu tinha levado comigo uma cassete da Nina Simone a tocar piano. O apresentador fez-me perguntas, estranhou onde era Portugal, expliquei-lhe que se nadasse sempre em frente chegaria a Lisboa. E quando lhe contei que tinha um programa de cinco minutos fechou o microfone, pensava que eu me tinha enganado no inglês! No fim, pôs a minha cassete da Nina Simone e ia caindo da cadeira: nunca a tinha ouvido só a tocar o piano. Saí daquela rádio orgulhoso.

Um orgulho tão grande que, certamente, no regresso a Lisboa, obrigaram o José Duarte a pagar excesso de bagagem.»

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